.

.

3 de jan. de 2021

Fome adormecida *

Não é só a música que pode tomar forma em nossa mente. Percebi hoje que o silêncio também pode ser formulado e "ouvido" dentro de nossas cabeças. É por esse motivo que essas imagens me trazem paz. Uma paz gostosa e um tanto melancólica.

Quando "ouço" esse silêncio dentro de mim, criado pela contemplação de imagens como essa, é quando me dou conta do tanto de barulho que me rodeia e do quanto preciso, desesperadamente, de um casulo. 

Algumas necessidades nossas só são notadas quando provocadas. É como quando passamos em uma padaria e sentimos o cheiro do pão fresco. De repente nosso paladar acorda, tudo acorda. Não sabíamos que estávamos com fome. Não se trata de gula. Estou falando de "fome adormecida". 

Há fomes que adormecem em nós por pura distração. Excesso de atividades, de passa-tempo ou de barulho.  O barulho desconecta nosso cérebro do corpo. Estranho percebermos de repente que estávamos dormindo, enganando nossa alma. 

Quando nos apaixonamos também é assim. Abrimos os olhos e percebemos que não estávamos vivendo. Parece que tudo o mais era em preto e branco. A vida era dormente e preguiçosa, indigna de qualquer arroubo. Aí a paixão aparece e o desespero da fome antiga ressurge. "Estou viva e com fome de vida! Como consegui ficar tanto tempo sem viver?!"

Esses "despertares" são tristes e alegres. Interessantes e angustiantes. Nada garante que não adormeceremos de novo. 

Essas imagens me "desadormecem".   Em um primeiro  momento preciso do silêncio, da contemplação. Quero ouvir apenas os estalos dos galhos, zumbidos de pequenos insetos e passarinhos lá longe. Meu Deus, como quero isso!

Tomar banho, colocar a roupa mais confortável do mundo, o perfume mais fresco e simplesmente ir. Quero andar resoluta e em linha reta só por ir. Por nada e em busca de ninguém. E sem sentir os pés doerem.  Depois vou querer parar em qualquer lugar por tempo infinito deixando os olhos navegarem ao acaso.  E depois seguir em frente mais livre do que nunca. E,  quem sabe, voltar pra casa com a alma fresca.

Os sons do mundo são opressivos. E essas gravuras despertaram minha fome antiga. Acho que tenho dormido demais.

 

Nenhum comentário:

Páginas