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7 de ago. de 2011

Eu era infeliz e não sabia


Algumas realidades deveriam manter-se longe dos nossos olhos, para o bem da nossa felicidade.


Na idade da inocência eu batia no peito dizendo que nós, brasileiros, somos um povo livre. Balela! Eu olhava outros povos supostamente oprimidos por governos totalitários e dizia: "coitados, não sabem o que é liberdade" ou "sou livre; eles, não. Tadinhos."    Isso tudo até o dia em que me vi na Europa. Foi uma beleza mas... também foi um choque.

Não sei explicar bem como me senti. Não sei se era sentimento de humilhação ou surpresa ou raiva por viver enganada por tanto tempo.

Em uma noite fria e desocupada de Paris resolvemos ir, à pé, à torre Eiffel. Fui tensa, agarrada à minha bolsa, mantendo-a sempre junto ao corpo. Que coisa mais patética! Custei muito a relaxar. No retorno, lá pela meia-noite, demorei a entender que ninguém iria pular em mim, me arrastar para o muro e roubar minhas coisas. Olhei para um lado e para outro procurando pessoas tensar pela aventura de sair a noite à pé. Tudo o que vi eram pessoas despreocupadas carregando seus bolsas displicentemente. E ninguém me observava.  Que povo estranho! Então ninguém tem medo? Como podem ser tão descuidados?Atrás de cada árvore pode pular um assaltante. Será que eles não assistem os noticiários?

Em todo lugar existem bandidos, mas uma situação esculhambada como a do Brasil é rara.

Londres, centro da cidade. Todo centro de cidade é o terror, principalmente à noite. Fomos a um pub quentinho. Adorei. Era noite e chuviscava quando retornamos a pé para o hotel. Entra aqui, dobra ali, e de repente poderia aparecer um mal encarado para nos esfaquear e levar nossas libras. Não apareceu. Estranho, né?  As pessoas caminhavam encolhidas pelo frio, não pelo medo. Gringo é esquisito mesmo. São meio indefesos, ingênuos, não vêem maldade em nada. Nós é que somos espertos, né?

Por fim, o golpe fatal contra o meu ego de brasileira deu-se em Frankfurt.  Fomos jantar no centro da cidade. O carro não poderia subir o calçadão. Tínhamos que sair do veículo e andar algumas quadras a pé até chegar ao restaurante.  Pense numa mulher com medo. O guia estava conosco. Não me refiro ao Espírito Santo (que também estava) mas ao guia turístico. O tempo todo ele acalmava nossos ânimos dizendo que poderíamos ficar tranquilos, que era normal as pessoas caminharem a noite pela cidade deserta sem serem severamente punidas pela bandidagem; "Podem ficar tranquilos! Eu afirmo a vocÊs que não tem problema. Sou acostumado a andar por aqui e estou vivinho da Silva."   Era mais fácil eu acreditar que o guia já havia morrido. Viver é arriscar-se. Talvez fosse chique ser esfaqueada em Frankfurt.  Passamos por vielas e por uma construção. Todos sabemos que construções no centro da cidade são tocas de bandidos. Eles aparecem do nada, depenam todo mundo e depois vão para outro planeta onde vivem felizes, gozando os bens do nosso trabalho.


Os bandidos europeus são muito legais de deixarem o povo andar livre pela cidade, né?

Amei a Europa, mas nada me impressionou mais do que a liberdade de andar pelas ruas. Como é bom!  Foi o que vi de mais encantador e empolgante. Minha maior saudade é essa. Pena que não dê pra tirar foto da liberdade...  se não eu a fotografaria e colocaria na parede da minha sala.

Queridos patrícios, vocês não sabem como é maravilhosa essa tal "Liberdade de Ir e Vir " que tanto falam.

Isso foi o melhor e o pior da minha viagem. Fiquei chocada ao perceber o quanto somos escravos, o quanto somos oprimidos, o quanto vivemos mal por aqui. Não invejo construções nem museus nem carros. Não invejo o Sena nem os castelos. Invejo sim, com tristeza e revolta, eles terem permissão para andar pelas ruas de seu próprio país sem sentirem o pavor que nós sentimos.

Viajar pode fazer mal. A gente vê, a gente compara.  A liberdade que eu comemorava, simplesmente não existia.

Moro a três quarteirões do meu local de trabalho. Adoro andar a pé mas vou trabalhar de carro por medo de ser agredida. Não sou neurótica. Meu medo é baseado na mais miserável realidade.

Sabem o que eu mais queria? Poder bater pernas  por aí sempre que eu quisesse. Um sonho banal para uns, mas tão complicado para outros.

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