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30 de ago. de 2011

Alguém maior do que você e eu


Aproveitar


Rapidinho;

Frente ao fim do mundo, existem principalmente três tipos de pessoas:
1) Há aqueles que, sabendo que tudo vai acabar, resolvem fazer a coisa certa. Geralmente têm a idéia de pedir perdão pra todo mundo e, de quebra, contar pro filho que ele é adotado.

2) Há aqueles que, sabendo que tudo vai acabar, a primeira idéia que lhes vem é transgredir. Finalmente transgredir!!! Sem colher os frutos amargos da transgressão. Por algum motivo esse tipo de gente pensa logo em todas as variações possíveis para o sexo, para as drogas e para curtir com a cara dos outros.

3) Há ainda aqueles que, sabendo que tudo vai acabar, não pensam exatamente em transgredir ou em ajeitar nada. Apenas querem "aproveitar". Assim, no genérico.

Para uns "aproveitar" significa consertar. Para outros, significa transgredir. Mas para essa terceira categoria "aproveitar" é apenas fazer coisas agradáveis sem muito drama. Isso envolve tanta reflexão que eu desconfio de que essa categoria de pessoas é justamente a que vai ficar paralisada com a "metralhadora da vida na mão" sem saber ao certo pra que lado atirar. 

"Aproveitar" é uma coisa muito relativa, a ponto de ser inquietante. É tão relativa que tem um monte de gente que jura que está aproveitando mas, a gente olhando pra eles do lado de fora, acabamos achando que elas estão vivendo uma vidinha chinfrim de "um e noventa e nove."

"Aproveitar" é tão relativo mas tão relativo que tem gente que acredita de coração que dar a vida por uma causa ou pelo próximo não é perder nada; é aproveitar e dar significado à sua existência.

Pra vocês verem: "dar significado à própria existência" é considerado por alguns justamente como "desaproveitar a vida".

E você? Está "aproveitando"?  Ande logo porque o mundo vai mesmo acabar. Só não sei quando.

27 de ago. de 2011

Alberto Caeiro

"...Quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar..."

26 de ago. de 2011

Sobre o filme Árvore da Vida

Esse filme é excelente... ou uma droga - tudo depende de como sua mente vai processá-lo. Depende do seu "eu espiritual".

Era para ser um filme edificante e direcionado a qualquer um. E é, mas a linguagem escolhida para transmitir a idéia é... digamos... enigmática demais.

Desconfio que raras pessoas vão gostar. Eu mesma só gostei porque já li o livro de Jó e quase pelo meio do filme consegui juntar uma coisa com outra. Nem todos os cérebros no cinema seguiram a mesma linha. Deve ter sido por isso que ouvi umas reclamações e uns risos de deboche no cinema. Quando saí para pagar o estacionamento ouvi um rapaz dizer às amigas: "E eu pensava que só eu fosse doido! Ha ha ha" . Por aí você tira.

O diretor quis passar uma mensagem poderosa. Para isso, palavras seriam insuficientes. Sendo assim ele lançou mão de imagens para nos fazer mergulharmos em nós mesmos e no nosso tal "eu espiritual". Pra mim valeu.

Se a idéia de Deus não é forte em você, se você não tem questões existenciais, se você não se faz perguntas inquietantes, então desista de ver o filme.

Tá, admito que estou me enrolando toda pra falar da história. É que é complicado!

Pra começar: o Brad Pitt já está enchendo o saco com essa mania de fazer papel de feio. Alguém tem que dizer a ele que personagem bonito também pode ser sério, pode ser profundo e pode render Oscar. Não gostei muito desse trabalho dele mas tudo bem. E todos os demais atores foram ótimos.

E a história? É sobre uma família "anos sessenta". Família tradicional, classe média e bem estruturada. O pai, chefão de família, é trabalhador, sério, responsável, carinhoso mas... rígido demais. A educação em sua casa é ao estilo minitar e isso desencadeia uma pré-crise de adolescência em um de seus filhos. Ele vai se tornando rebelde, amargo, questionador e triste. Em dado momento ele odeia o próprio pai.

Pronto, é isso. Agora e a mensagem? Bem, é uma coisa tão subjetiva que o que eu entendi pode não ter nada a ver com o que o diretor quis dizer. Posso fazer um discurso inflamado sobre o filme e no final o diretor se levantar e me perguntar: "Que filme é esse mesmo que você está falando? Não foi o que eu fiz não, né? Nada a ver!"

Pois é.

Eu acho/parece/tenho a impressão de que se trata da história de uma pessoa que trilha um longo e tortuoso caminho emocional até encontrar-se finalmente com Deus. Assim eu percebi. Se você entender o inverso não vou discutir.

Repito: só entendi o filme porque já li o livro de Jó (Bíblia) e a história começa justamente com um trecho que diz mais ou menos o seguinte (na minha linguagem pra lá de coloquial):

"Como é que é? Você quer mesmo que eu responda às suas perguntas? Vem cá, onde você estava mesmo quando eu criei os fundamentos da Terra?"

Essa primeira frase é a base de tudo. Outra frase fundamental eu li certa vez e fiquei matutando:

"Para encontrar Deus é necessário primeiro perdê-lo".

Cara, é isso!

Sussurros, imagens misturadas, simbolismos profundos, frases perdidas, nada parece ter um propósito. Contar uma história desse jeito é bem a propósito!

Fiquei impactada por aquelas imagens de explosões, quedas d'água poderosas, infinito, galáxias, peixes, células... até entender que tudo aquilo remetia à idéia de Deus. Eram imagens metafóricas para nos levar a pensar no indizível. O diretor não falou de Deus mas mostrou o que é a extrema beleza misturada ao medo absoluto; o que é a imensidão, o que é sentir-se um nada perdido no tudo, em meio a um turbilhão de acontecimentos e forças incontroláveis. Como conversar com o cosmos, com o oceano, com o sol? Diante de tudo isso só nos resta dizer que "não está mais aqui quem falou". Dá medo olhar e se imaginar no meio de tudo aquilo. Incompreensível, imenso, indomável. Assim foi passada a idéia de Deus - e é assim que eu imagino, por isso me identifiquei com tudo. E gostei.

O medo só não nos vence porque a beleza nos acalenta em cascatas de deslumbramento.

Tudo a ver com Jó descobrindo o Divino depois de tanta coisa esquisita em sua vida. Ele precisou primeiro sofrer, questionar, se revoltar, querer morrer, querer matar, gritar que nada fazia sentido, brandir o punho, sentir ódio, achar que tudo é mentira.,. para só depois dar de cara com o Amor Profundo.

Pra não me alongar demais - uma vez que o tema me empolga - completo dizendo como percebi as últimas cenas, aparentemente sem sentido: encontrar Deus é também reencontrar-se consigo mesmo e fazer as pazes com o bebê que você foi, com a criança, o adolescente, o adulto, e abraçar todo mundo. É se pacificar, consigo e com o universo. É também reencontrar o jovem pai, o velho pai, a mãe em todas as idades e com os irmãos também em todas as idades e poder abraçá-los em paz com tudo resolvido, sem pendências. É perceber que todos os "despropósitos" tinham um propósitoe tudo foi bom. É reencontrar todo mundo que fez parte da sua história, todos, em um momento mágico, e perceber que por fim tudo era apenas um enigma amoroso.

Quem encontra Deus se encontra também consigo mesmo e faz as pazes com o universo.

Lindo. E estranho. Assim é o filme e assim é a nossa vida.

25 de ago. de 2011

A vida já foi mais simples

Li no Blog da Sílvia,  uma postagem que fala justamente sobre a perda dos prazeres simples da vida. Pois é... É incrível como, no passado, já nos empolgamos com coisinhas de nada! Coisas que hoje não nos tocam de forma alguma. Não acho que isso seja algum tipo de evolução. Empobrecemos, isso sim, ao perder tantas fontes de prazer.

1- Antigamente eu adorava o reinício das aulas. Eu curtia principalmente o cheiro do material escolar novo dentro da pasta e as meias novas bem branquinhas.

2- Eu adorava quando meu padrinho dizia que eu era uma tremenda cabrocha. Hoje em dia ninguém nem sabe o que é isso!

3- Eu adorava lamber a tigela com a massa crua do bolo que minha mãe fazia.

4- Eu adorava ouvir bilhões de vezes os mesmos discos de histórias. Hoje não temos discos de história, mas DVD's. A coisa piorou. Antigamente eu ouvia o narrador e exercitava incrivelmente a minha imaginação. Era muito mais legal. Hoje eles imaginam tudo no lugar das crianças...  Não houve um empobrecimento? Houve.

5- Eu gostava de ouvir a conversa dos adultos e tentar entender o mundo deles. Tudo me parecia misterioso e interessante.

6- Eu adorava dormir no colo da minha mãe na igreja. Era maravilhoso deitar a cabeça na Bíblia que estava em seu colo. Até hoje lembro do cheiro do couro da capa da Bíblia da mamãe.

7- Eu adorava, quando faltava luz. Era muito divertido brincar com a sombra na parede.  Ríamos tanto, eu e meus irmãos!

8- Eu adorava brincar de roda. Em todos os aniversários havia brincadeira de roda.

9- Eu adorava, nos aniversários, a hora da distribuição dos balões. Era um para cada criança e ficávamos muito felizes e empolgados em receber um. Passávamos a festa toda escolhendo qual iríamos pedir. "Aquele verde vai ser o meu!" "Ah, vou pedir o branquinho!" Nossa!

10- Eu gostava de colecionar ossinhos de rabada. Depois de comer uma deliciosa rabada nada melhor do que lavar os ossinhos para brincar. Brincar de quê? Ora, a gente dizia que os ossos eram os boizinhos. Era empolgante ter um "rebanho".

11- Eu adorava "fazer bolo". Receita: farinha, água, açúcar. Colocava em uma panelinha, deixava a farinha inchar. Quando virava no pratinho, tínhamos um bolo absolutamente comestível. Eu achava uma delícia!  Quando conseguíamos ter acesso à lata de leite em pó era a glória! Aí o bolinho ficava mais gostoso ainda.

12- Eu adorava fazer o contorno das figuras de uma revista furando-as com um alfinete. Depois de tudo furadinho eu colocava a imagem contra a luz e ela se iluminava! Era como se estivesse cheia de estrelinhas!!!!

13- Eu adorava caminhar pela casa com um espelho sob os olhos, de forma que o que enxergava era o teto, não o chão. Eu me confundia toda e isso era muito engraçado. Claro que de vez em quando dava de cara na parede, mas isso é mero detalhe.

14- Eu passava horas muito felizes brincando de ser princesa.

14- Etc, etc.

É, a vida já foi bem mais simples...

22 de ago. de 2011

Os presos de Palau, da República da Micronésia.


"...  As storyboards são vendidas até por 1,500 dólares cada uma. O dinheiro vai para um fundo de restituição. É isto mesmo, cada preso tem que trabalhar para restituir o que roubou da sociedade. Não se paga a dívida social apenas sofrendo. Se paga pagando de verdade o estimado prejuízo que se causou. Se não paga não sai.

Minha amiga e anfitriã trabalhou na cadeia com restauração de destinos por muitos anos. Ela diz que 90% se recuperam e não reincidem. A comida é boa e as acomodações decentes. Me pergunto quais são os abismos que separam as nossas culturas..."


Leia Mais em: http://www.genizahvirtual.com/2011/08/remoto-e-insignificante.html#ixzz1VlSs5Qsn
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Gostei da pergunda

Li no Twitter: Qual seria a sua idade se você não soubesse quantos anos você tem?

21 de ago. de 2011

Não transe mais


Não transe mais.

Se você ouve essa norma e interiormente percebe que pode cumpri-la, então você tem tudo pra ser magro. Sorria!  Porque fazer dieta é a mesma coisa. É aquela vontade de cair de boca no sonho mas se contentar com duas torradas secas.

Abrir mão do prazer de comer não é mais fácil do que fazer um voto de castidade. Aliás, é pior. Até porque somos mais pressionados para comer do que para transar. Sério, pode reparar! E olha que a indústria do sexo não está aí pra brincadeira!

Abrir mão da feijoada, do churrasco, da maniçoba, das batatinhas com chope, do biscoito recheado, do sorvete com bolo, da torta alemã... equivale a dizer: "- Não transe mais e você alcançará a glória eterna"   - que, no caso, é ser magro.

Tenho pra mim que uma pessoa fiel à uma dieta e que convive com a privação  é alguém a um passo da santidade. Porque quem segura a boca, segura todos os outros impulsos naturais, segura qualquer onda! Só não é santo se não quiser porque tem todas as ferramentas. Quem passa fome pra ficar bonito tem condições de abrir mão dos confortos da vida, das riquezas, do sexo, da desonestidade, de falar mal dos outros, tem condições de perdoar infinitamente, de amar incondicionalmente, de trabalhar incessantemente.

Se você tem tendência a engordar mas consegue segurar a fera que existe no seu estômago, saiba: você tem potencial pra figurar, no futuro, em qualquer altar da Igreja Católica. E com distinção, na comissão de frente!

Alface, melão, maçã, abacaxi, requeijão zero... Tudo isso é muito bom. Um dia, dois dias... mas a longo prazo vai dando uma espécie de "atraso interior" e a gente começa a sentir que está gestando um monstro devorador. É igualzinho a sexo. Uma pessoa que você não deseja e que "não resolve" pode ser um bom parceiro por uns tempos. Você aguenta firme. Masss...   com o passar dos dias, das semanas, também vai surgindo aquele assustador "atraso interior" que é uma bomba relógio!

Tudo é uma questão de treino. Minha tese é: quer fazer voto de castidade? Comece não comendo. Quer emagrecer? Comece não fazendo sexo.

Você consegue.


18 de ago. de 2011

Desmoronar em paz


O sonho das cadeiras gêmeas é um dia poderem desmoronar em paz.

É saber que finalmente chegaram ao fim da linha e ninguém espera mais nada delas. É, são assim as cadeiras.

Vai-se a mesa, as crianças, os velhos, as visitas. Vai-se o café quente, o compadre, as moscas, mas estará tudo bem desde que tenham uma à outra. Cadeiras solitárias são muito tristes quando ficam velhas. Precisam das suas iguais para ainda fazerem sentido.

Os donos se foram. Tomara que tenham conseguido prosseguir juntos, recostados um no outro como se o mundo fosse desnecessário. Tomara que tenham conseguido tornar o mundo, enfim, desnecessário - como as cadeiras abandonadas. Para trás ficaram muitas histórias que vez por outra parecem tão tristes!

Em dado momento as pessoas se levantaram... e partiram. Veio o pó... e o descanso.  Fim da linha, fim do trabalho. Podem agora, finalmente, desmoronar em paz sem reformas, sem marteladas, sem vernizes ridículos.

Às vezes parece-me que os velhos ainda estão alí sentados, invisíveis, vendo o passado como quem vê um filme que não acaba nunca. Porque o passado é um filme que não acaba nunca.  Um filme que roda no espaço, exibe-se perante estrelas confusas, desinteressadas, distantes. Elas não se importam em nos ver novamente vívidos, correndo, chorando, rindo, ou sendo consolados no colo de nossa jovem mãe.  

17 de ago. de 2011

15 de ago. de 2011

O problema é o frigobar

Gostei bastante  deste texto da Danuza Leão, com o qual me identifiquei. bem que eu iria escrever sobre isso mas ela o fez primeiro e melhor do que eu faria. Não se trata de uma obra de arte literária, mas é gostoso de ler. Ah: sou fã assumida da Danuza.


"Morar em um hotel é o meu sonho de consumo. Aquela sensação de transitoriedade, de que você não está amarrada a nada, de que está em trânsito pela vida, sem uma só responsabilidade. Tem coisa melhor? Fora o conforto. Se estou em casa e quero comer um queijo quente, nunca tem o queijo ou o pão acabou (e isso é apenas o começo). No hotel, é só pegar o telefone e em segundos chega um sanduíche perfeito, ainda com direito a uma folha de alface e uma rodela de tomate, coisa rara de encontrar, pelo menos na minha geladeira. E a lavanderia? Quando quero usar a camisa que mais adoro e descubro que ela está com uma mancha, é só chamar a arrumadeira e dizer, tranquilamente, que preciso da peça pronta até as 7 da noite. Esses milagres, só em hotel.

Os porteiros, na maior gentileza, me dizem “Bom dia, senhora”, “Boa noite, senhora”, “Pois não, senhora”, sempre com a maior boa vontade, e se precipitam para levar meus embrulhos, como se eu fosse um bibelô de porcelana, frágil, sem condições de carregar um pacotinho com um par de meias, oh, maravilha. E, se às 3 da manhã precisar de uma aspirina, um envelope ou um tubo de cola, nenhum problema: é só pedir e logo aparece alguém com tudo em cima e um grande sorriso de felicidade. Com uma boa gorjeta, então, nem se fala.

Nunca pensar na existência de um bombeiro, de um eletricista, de um carpinteiro ou pintor, nunca mais enfrentar uma lista de compras, que felicidade. Nunca mais ter que ir ao banco para pagar a conta do telefone, da luz, do gás; jamais, jamais ter que providenciar o conserto da televisão. Não é tudo o que um mortal pode almejar? A manutenção cuida de tudo, santa manutenção. E tem mais: quem não quer ter a roupa de cama e as toalhas do banheiro trocadas todo santo dia? E nada de precisar se preocupar com o sabonete, o xampu, o algodão, os lenços de papel e o cotonete. Usou, o hotel repõe. Se existe um paraíso sobre a terra, seu nome é hotel.

Há quem diga que um quarto de hotel é impessoal, mas isso pode ser resolvido. Basta levar umas fotos, uns objetos, um pequeno som, uns CDs e pronto: o quarto vira um lar. E abrir o frigobar e ver aquela perfeição – Coca-Cola, guaraná, água tônica, umas barrinhas de chocolate, pacotinhos de amendoim e castanhas, garrafinhas de uísque, vodca, campari, até de champanhe. Tem melhor?

O frigobar: é exatamente aí que a coisa pega. Uma hora bate uma irritação de saber que ele está lá todos os dias, exatamente igual, e ter certeza de que ele será eternamente o mesmo, que jamais se vai encontrar ali um pedaço de carne assada que sobrou do almoço e um pão de forma para fazer um bom lanche. Isso não é vida.

Um sanduíche bem caseiro, uma cerveja bebida na lata, um banheiro desarrumado porque alguém passou por lá; e saber que na manhã seguinte vai poder dar uma bronca na empregada. Essas podem ser as próprias imagens da felicidade."

7 de ago. de 2011

Eu era infeliz e não sabia


Algumas realidades deveriam manter-se longe dos nossos olhos, para o bem da nossa felicidade.


Na idade da inocência eu batia no peito dizendo que nós, brasileiros, somos um povo livre. Balela! Eu olhava outros povos supostamente oprimidos por governos totalitários e dizia: "coitados, não sabem o que é liberdade" ou "sou livre; eles, não. Tadinhos."    Isso tudo até o dia em que me vi na Europa. Foi uma beleza mas... também foi um choque.

Não sei explicar bem como me senti. Não sei se era sentimento de humilhação ou surpresa ou raiva por viver enganada por tanto tempo.

Em uma noite fria e desocupada de Paris resolvemos ir, à pé, à torre Eiffel. Fui tensa, agarrada à minha bolsa, mantendo-a sempre junto ao corpo. Que coisa mais patética! Custei muito a relaxar. No retorno, lá pela meia-noite, demorei a entender que ninguém iria pular em mim, me arrastar para o muro e roubar minhas coisas. Olhei para um lado e para outro procurando pessoas tensar pela aventura de sair a noite à pé. Tudo o que vi eram pessoas despreocupadas carregando seus bolsas displicentemente. E ninguém me observava.  Que povo estranho! Então ninguém tem medo? Como podem ser tão descuidados?Atrás de cada árvore pode pular um assaltante. Será que eles não assistem os noticiários?

Em todo lugar existem bandidos, mas uma situação esculhambada como a do Brasil é rara.

Londres, centro da cidade. Todo centro de cidade é o terror, principalmente à noite. Fomos a um pub quentinho. Adorei. Era noite e chuviscava quando retornamos a pé para o hotel. Entra aqui, dobra ali, e de repente poderia aparecer um mal encarado para nos esfaquear e levar nossas libras. Não apareceu. Estranho, né?  As pessoas caminhavam encolhidas pelo frio, não pelo medo. Gringo é esquisito mesmo. São meio indefesos, ingênuos, não vêem maldade em nada. Nós é que somos espertos, né?

Por fim, o golpe fatal contra o meu ego de brasileira deu-se em Frankfurt.  Fomos jantar no centro da cidade. O carro não poderia subir o calçadão. Tínhamos que sair do veículo e andar algumas quadras a pé até chegar ao restaurante.  Pense numa mulher com medo. O guia estava conosco. Não me refiro ao Espírito Santo (que também estava) mas ao guia turístico. O tempo todo ele acalmava nossos ânimos dizendo que poderíamos ficar tranquilos, que era normal as pessoas caminharem a noite pela cidade deserta sem serem severamente punidas pela bandidagem; "Podem ficar tranquilos! Eu afirmo a vocÊs que não tem problema. Sou acostumado a andar por aqui e estou vivinho da Silva."   Era mais fácil eu acreditar que o guia já havia morrido. Viver é arriscar-se. Talvez fosse chique ser esfaqueada em Frankfurt.  Passamos por vielas e por uma construção. Todos sabemos que construções no centro da cidade são tocas de bandidos. Eles aparecem do nada, depenam todo mundo e depois vão para outro planeta onde vivem felizes, gozando os bens do nosso trabalho.


Os bandidos europeus são muito legais de deixarem o povo andar livre pela cidade, né?

Amei a Europa, mas nada me impressionou mais do que a liberdade de andar pelas ruas. Como é bom!  Foi o que vi de mais encantador e empolgante. Minha maior saudade é essa. Pena que não dê pra tirar foto da liberdade...  se não eu a fotografaria e colocaria na parede da minha sala.

Queridos patrícios, vocês não sabem como é maravilhosa essa tal "Liberdade de Ir e Vir " que tanto falam.

Isso foi o melhor e o pior da minha viagem. Fiquei chocada ao perceber o quanto somos escravos, o quanto somos oprimidos, o quanto vivemos mal por aqui. Não invejo construções nem museus nem carros. Não invejo o Sena nem os castelos. Invejo sim, com tristeza e revolta, eles terem permissão para andar pelas ruas de seu próprio país sem sentirem o pavor que nós sentimos.

Viajar pode fazer mal. A gente vê, a gente compara.  A liberdade que eu comemorava, simplesmente não existia.

Moro a três quarteirões do meu local de trabalho. Adoro andar a pé mas vou trabalhar de carro por medo de ser agredida. Não sou neurótica. Meu medo é baseado na mais miserável realidade.

Sabem o que eu mais queria? Poder bater pernas  por aí sempre que eu quisesse. Um sonho banal para uns, mas tão complicado para outros.

6 de ago. de 2011

E se...

Quando foi mesmo o dia mais feliz da minha vida?
Consigo lembrar de várias ocasiões nas quais eu exclamei que aquele era o dia mais feliz da minha vida. Lembro de ocasiões tolas, que não mereciam o rótulo, e de outras ocasiões relevantes. Mas tudo passou. E agora?


Acabei de imaginar uma coisa muito incômoda:  e se o dia mais feliz da minha vida já aconteceu? E se, daqui por diante todas as minhas felicidades forem menores?


"Cristina, você já comeu a cereja da sua vida."  E se um ser encapuzado aparecesse para me dizer isso? Eu ia reclamar: pô, deveriam ter me avisado na hora! Pelo menos eu comeria mais devagar.


Será que vivo em função de encontrar de novo "o dia mais feliz da minha vida?" Se vivo, tudo terminaria quando eu descobrisse que ele já foi. É como a gente ir tirando dinheiro do cofre na suposição de que existe muito mais lá dentro. Um dia a gente descobre que não há mais moedas de outro. "Se eu soubesse não gastaria tudo tão rápido."


E se eu já esgotei minha cota?


Chega de perguntas.

5 de ago. de 2011

Transgressão



Levantei da cama cedo
Como se ouvise algum som
Olhei para o dia com medo
Mas fingi que ia ser bom

Tomei o café da manhã
Como se preferisse adoçante
Almocei uma maçã
Tentando ficar elegante


Comi alface sem graça
Rejeitei bacon crocante
Sorri de mentira na praça
Com o coração soluçante

Parecia um sonho maluco
Onde nada combinava
Tomei um copo de suco
Para ver se aliviava
E veio uma pressão no peito
Que nem o suco deu jeito.

Abracei quem me abriu os braços
Pois deles não pude fugir
Mas perdi os doces laços
De quem nunca mais pôde vir

Ajudei quem não amava
Fingi alegria na festa
No enterro eu só pensava
Em coisa nada funesta

Dei atenção mentirosa
A assunto sem sabor
E calei teimosamente
Às coisas que falam de dor

Senti uma pressão no peito
Por tanta contrariedade
Mas disse: "Isso não tem jeito!
Vivemos em sociedade!"

Odiei o calor do sol
E a chuva que me molhou
Mas lembrei que é pecado
Reclamar do que Deus criou

Desejei o que não sei explicar
Expliquei o que nunca entendi
Cansei de me pôr a pensar
Nas incoerências daqui,


Desse mundo desbotado
E suas histórias singelas
Com capítulos misturados
E ideais que a gente anela.


Parecia um sonho maluco
Onde nada combinava
Tomei um copo de pinga
Para ver se aliviava
Mas veio a pressão no peito
Que nem pinga aliviava.

Não sei mais a diferença
Entre ser sincera ou má
Viver pedindo licença
É uma coisa de amargar!

Mas senti pressão no peito
Quando olhei a tarde fria
E admiti pra mim mesma
Que nada disso eu queria.

Corri sem querer chegar
Levantei fora de hora
Fui salva pela transgressão
Daquela última hora:

De tanto pensar deitada
Nas coisas que faria de pé
Caí de noso, cansada,
Pensando em como a vida é

E sonhei sonho tão louco 
Tão cheio de transgressão
Com desaforos, com soco
Em quem merecia prisão!

Vivi amores malucos
Todos bem correspondidos
Havia romances e coitos
Que não eram interrompidos

Um sonho sincero e humano!
Lavei minha alma dormindo
Me apeguei àquele momento
De magia, e muito lindo


  Sonho louco e transgressor
Com liberdade total
De consertar esse mundo
E detonar todo o mal
E rejeitar programa chato
De caráter social


Quis dormir mais umas horas
Pra curtir aqueles fatos
E voltar a ser senhora
Em sociedade de ratos


Acordei aliviada
Pois sonhei tudo o que quis
Ai como eu estava cansada!
Mas bem que eu queria um bis

E tão sinceros eram os sonhos
Que nem posso te contar
No que daria esse mundo
Se eu os pudesse executar?

3 de ago. de 2011

Qual a importância do esporte em sua vida?


1- O esporte é importante para me mostrar como sou acomodada e sem força de vontade. É, portanto, uma lição de humildade.


2- O esporte é importante porque quando eu o pratico sou tomada pela ilusão de que sou jovem e cheia de vida.


3- O esporte é importante em minha vida porque é muito agradável comparar-me com os sedentários e imaginar que eles vão morrer primeiro (ainda que eles estejam mais seguros dentro de casa do que eu, correndo na rua).


4- O esporte é importante porque adoro fazer compras. Só que frequentemente sinto-me culpada pelo consumismo. Adquirir roupas de academia é um tremendo álibi emocional: gasto do mesmo jeito mas estou perdoada porque é por uma boa causa.


5- A importância do esporte é que quando pratico esporte só preciso pensar no esporte. Os problemas vão para debaixo do tapete (e não consigo imaginar lugar melhor para eles).


6- O esporte é importante em minha vida porque quando eu morrer ninguém vai dizer que a culpa foi minha. Eu fiz a minha parte!


7 - O esporte é importante porque dizem que é importante, então deve ser importante mesmo.


8- O esporte é importante porque me faz viver em contagem regressiva esperando chegar o grande dia em que acordarei gostosa e sarada. O dia não chega nunca mas o que seria da vida sem as ilusões?


Essa é a minha contribuição para a campanha Esporte é Vida. 

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