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31 de dez. de 2015

Talvez você precise pintar os cabelos *

Está chegando o dia em que vou pintar os cabelos. E cortá-los também. Pode ser  logo agora, em 2016. Não sei, mas intuo que está perto.

Para quem não sabe, pintar os cabelos ou mudar radicalmente o corte é algo que pode ter um significado profundo. É um lance de alma. Já vi gente mudar completamente o visual depois de uma desilusão amorosa - por exemplo.

Mas tudo depende do contexto. Algumas pessoas são exóticas, fora dos padrões tradicionais desde sempre. Tudo bem. Não são essas pessoas sobre as quais quero teorizar hoje. Quero falar sobre aquelas sobre as quais baixou, de repente, um "espírito camaleônico".  Uma dor em adiantado estado de superação pode estar visitando aquele coração.

Reinventar-se tem a ver com sinalização. No ontem dessas pessoas coloridas possivelmente exista um ponto final, um enorme ponto final que, no entanto, passaria despercebido se ela não sinalizasse. Pintar, mudar, cortar, tem a ver com criar um marco. É uma forma de mostrar - mais pra si mesma do que para os outros - que acabou, não quero ser, não sou mais aquela pessoinha de ontem. Colori, ousei, mudei.

Não, quem faz isso dificilmente o faz para mostrar para os outros. Geralmente é para mostrar a si mesmo quando olha no espelho. É como um lembrete e uma advertência para não amolecer, não voltar atrás. Todos os dias ela saberá que assumiu consigo mesma um compromisso: sacudir de si o que lhe atravancava, se assumir e ser mais leve.

As cores... Em todas as culturas atribui-se mensagens às cores. Elas são símbolos e lembretes para quem caminha pela vida. Vermelho: pare. Verde: siga. Cabelos coloridos: dizer adeus, se impor.

Gosto da idéia. Por isso desejo a todos os amigos cabelos coloridos e cortes ousados. Desejo a todos um rompimento decisivo com todos os pesos desnecessários que às vezes carregamos na vida.  E ao nos olharmos no espelho, que lembremos de não voltar atrás;  e que esses cabelos pedem novas roupas, novas posturas. Se em seu guarda-roupas não houver mais peças que combinem com esse novo "você", adquira coisas novas porque compromisso é compromisso.

Pinte os cabelos e seja feliz.

Acabou? Tem certeza? *

Acabou o quê? O ano? Acabou coisa nenhuma!

Meta na cabeça uma coisa: tudo o que você aprontou em 2015 ainda vai render filhotes em 2016.  Cada ano que  passa deixa sobras, retalhos e rebarbas. A coisa só vai acumulando.

As mancadas que você cometeu em 2015 serão lembradas para sempre por seus amigos e inimigos. Eles tem uma memória de elefante,  embora vivam esquecendo do dia do seu aniversário.

Sabe outra coisa que não acabou? As dívidas. Elas também ficam juntamente com os quilos a mais, a celulite, seu gênio indomável e a saudade dos que se foram. O vizinho chato renovou o contrato de aluguel: ele também fica.  As rugas também não se despedem de você no ano que se vai. Elas também dão filhotes. Aguarde.

Ah: os amigos, mas amigos meeeesmo, eles também ficam. Graças a Deus. E os que se afastaram... Na verdade nunca estiveram com você.

Essa coisa de passagem do tempo me faz refletir.  Por quê na segunda feira a gente fica torcendo para terminar logo a semana? Depois, a cada dia 15 a gente torce para acabar logo o mês. Concomitantemente também conseguimos torcer para não ficarmos logo velhos.  Faz sentido isso? Não faz.  É como torcer para os dois times ao mesmo tempo.

Anote: esse pendor para a incoerência também vai te acompanhar em 2016. Você vai continuar torcendo para chegar sexta feira, torcendo para acabar o mês, torcendo para a vida ser longa e torcendo para a velhice se atrasar.  

Nada acabou. Nem as obrigações acabaram. Nem a alegria ou a esperança. Não há porque torcer para que um ano se vá. Não há porque ficar melancólico nem alegre  pelo que se foi.

Sabe, o Ano Novo é um apartamento para onde a gente se muda mas leva junto todos os cacarecos do endereço antigo. Até as baratas vão junto. Por isso fique frio e não gaste muito dinheiro com fogos.  Ou gaste. Bom da vida é poder fazer as tolices que nos dão alegria.

26 de dez. de 2015

Bondadezinhas e bondadezonas


Bondadezona todo mundo quer fazer.

Enquanto acharmos que "fazer o bem" se refere apenas às grandes coisas estaremos escolhendo o mal mesmo sem querer. As "grandes coisas"  nem sempre estão no nosso caminho.

Nem todo mundo nasceu pra Joana D'Arc. Nem todo mundo funda creche ou asilo. Nem todo mundo vai ser missionário em lugares miseráveis. Nem todo mundo morre pelos outros. As "bondadezonas" entram pra história e cobrem de glória a memória dos seus praticantes. Por isso que a gente gosta tanto delas. Mas esses são os destinos de bem poucos.

O lado ruim das "bondadezonas" é que alguns pensam que se aderirem a esses grandes projetos estarão dispensados das minucias do dia a dia.  "Já distribuí sopa e lençóis para os moradores de rua; não tenho que aturar a tia chata." 

Acho que esse "sentir-se dispensado das coisas pequenas" equivale a escolher o mal frequentemente. Porque as grandes coisas atingem pessoas no atacado. Nessas situações não tenho que conviver no varejo com ninguém. As grandes coisas nem sempre demonstram que existe bondade em mim. E nem sempre demonstram que quero fazer o bem. As vezes apenas quero ME SENTIR BEM.

Fazer o bem na "vida real" tem  a ver com todas as paciências e pequenas gentilezas do dia-a-dia.  Tem a ver com dar atenção a gente chata, emprestar pra quem possivelmente não nos pagará, ajudar mesmo sabendo que fulano  teve todas as oportunidades na vida para ficar bem mas jogou tudo fora... Tem a ver com não ajudar a detonar a imagem do mala do escritório.

É... é dificil. Concordo.

Mais fácil é esperar um "grande momento" para aparecer à frente de um ato de caridade cinematográfico. Mais fácil passar a lista de uma "ação entre amigos" na qual todos saibam que eu fui a idealizadora e ainda subir no pedestal da bondade para constranger quem não quer ou não pode ajudar.

Como são difícieis as "pequenas bondades" ocultas...

17 de dez. de 2015

Dane-se


Quando vai chegando o final de ano os textos começam com "o Natal se aproxima, então..."  Não sempre, mas frequentemente é mais ou menos assim.  Não sei se você notou, mas tentei ser original.

Por que tentei se original? É justamente a "originalidade" que está corroendo o nosso Natal. Sabe aquela coisa que emocionava a gente e nos fazia gastar uma grana em ornamentação? Aquele clima de presépio e Menino Jesus? Céu azul-profundo estrelado e música com harpas? Pois é disso que estou falando.

Acho que originalidade é a maior inimiga do Natal. Os caras querem ser safos mas so fazem merda. Há coisas na vida que queremos sempre do mesmo jeito. Há coisas eternas,  que não enjoam. Há coisas que não devem ser tocadas, se não...

Natal , pelo que me lembro, vem de verde e vermelho sempre. Nenhuma criança nunca esperou que fosse de outra cor. Aí inventaram o Natal-perua, todo dourado ou prateado.

Ouvi dizer que é brega árvore com neve de algodão no Brasil. No meu tempo não era brega. Era chique demais e meu coração está naquele tempo.

Dane-se o natal tropical e politicamente correto. Dane-se o esnobismo pretensamente "cult" de quem a tudo questiona com risinho superior e pernas cruzadas.  É o que tenho a dizer por hoje: danem-se, designers de natais modernos. Fiquem os senhores sabendo que Natal é vermelho e verde e tem neve de mentirinha. Tem também aquelas músicas que só dão melancolia em quem não é mais criança. E antes que eu me esqueça, dane-se também quem já cresceu. Vai-se a juventude, ficam as lembranças.

Lembro que havia um encantamento naquelas festividades do passado. Procuro isso hoje e não acho mais. As festividades estão menos festivas. Talvez aquilo tudo fosse coisa da infância, da cabeça das crianças, não do Natal em si.  Talvez. Não estou convencida.

As músicas novas de Natal são chatas. Enfeites modernos são antipáticos e toda gracinha nova é sem graça. Até as bolas de plástico são chatas, já notou? Não são leves, geladinhas e mágicas como as antigas, que a gente tinha que pegar com todo o cuidado. Essas reverências faziam parte do encantamento, do clima todo. Elas eram de vidro fininho, uma casquinha de ovo. Um perigo para as crianças mas tô vivinha aqui para contar a história. Em janeiro nós as guardávamos em caixas semelhantes à cubas de ovos.  As bolas modernas perderam a leveza. São mais seguras e duradouras. Dane-se.  Quero minhas bolas que quebram porque era na frente delas, espelhadas e delicadas, que eu ficava com meus irmãos fazendo careta e rindo. As bolas modernas não são tão espelhadas. São meio foscas, meio embaçadas. Não refletem com exatidão nossas caretas e palhaçadas.

Danem-se as bolas de plástico. Danem-se as luzes xing-ling, as músicas modernosas, a Mamãe Noel gostosa. Quero aqueles Natais com meus irmãos vivos, meu pai, minha mãe. E com  "cabelos de anjo".

É... talvez tudo aquilo fosse só da infância, não do Natal. Dane-se a dúvida, dane-se o "talvez". A culpa é de todo mundo que se meteu a modernizar o que não pediu pra ser modernizado. Talvez tenham feito isso porque nunca sentiram o que eu senti.

Sei lá, to assim hoje.

16 de dez. de 2015

A Danuza Leão é assim

Me dou super bem com a Danuza. Você sabe, a jornalista.

A Danuza é assim:  uma mulher muito prática, elegante. Não é lá muito falante mas aprecia uma boa conversa. Não impõe assuntos mas quando é provocada desfia lentamente aquele novelo azul de lembranças deliciosas, falando de acontecimentos e épocas que a gente adoraria ter degustado mas acabou antes que a gente chegasse. Ficamos de fora. Aí a gente ouve, ouve... entre um biscoitinho e outro. Sabe, ela vai contado e sentindo se a gente quer ouvir mais. Geralmente quer. E geralmente ela não conta tudo.

A Danuza gosta de chá, sapatos confortáveis e pessoas discretas. Possui umas economias que garantem esse sossego chique que a gente conhece. Ela as vezes até que fala de seus amores mas guarda consigo uns dois ou três nomes secretos que não confidencia nem pra Deus.

Se não a conhece é possível que numa primeira impressão você a considere fria, desinteressada por sua amizade. Esnobe talvez. Mas vou logo avisando: ela fica cha-te-a-da quando lhe dizem isso. Mas cá entre nós, sem maldade: às vezes ela se põe meio distante mesmo e acaba conseguindo fazer com que uma pessoa se sinta invisível ao seu lado. Mas isso não acontece sempre! E nunca com os conhecidos. 

Ela é gentil embora use às vezes de uma gentileza meio distante. Acho que ela não acredita muito que a vida vá lhe brindar com amigos mais satisfatórios do que os que já possui. É um certo apego ao passado que a faz ser tudo para os que já ama e pouco para os que vem depois. Você vem depois.

Seus amigos a tratam com mimo (ainda se usa essa gíria?). Suas amigas são irmãs. Os segredos de todo mundo ela guarda junto com cartas, fotos e outros objetos cheios de significado. Pois é, quando Danuza ama, ama mesmo.

Quando a conheci foi a muito tempo atrás, muito por acaso, em um fim de tarde no Bloomingdales. Eu estava empolgadíssima com as vitrines enquanto ela parecia distraída e um tanto blasé, acompanhando uma amiga. Foi nessa ocasião, em uma conversinha fortuita, que ela me ensinou como usar uma pashmina que cismei de comprar.

Mentira. Tudo mentira. Nunca vi Danuza Leão nem pelas costas. É mais fácil um raio me decompor em cores do que ela se dar conta da minha existência ou ler um dos meus textos. 

Não tem problema. Não me importo se ela não lembra das tardes em que não estivemos juntas tomando chá e falando de namorados. Ela ainda não sabe, mas a gente é amiga pra caramba.

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