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4 de set. de 2016

Um certo tipo de beleza

Odeio usar termos batidos.  Queria uma expressão mais criativa para a velha e gasta "beleza interior". Enquanto não encontro, prossigamos.

Há um certo tipo de poder - podemos chamar assim? Um certo tipo de sedução que não se mede por exterioridades.  Essa coisa misteriosa se torna mais "perigosa" que a beleza física justamente porque nos desarmamos diante dela. Não farejamos o perigo.  Somos então pegos de surpresa.

Não estou aqui afirmando que não existam pessoas "feias". É politicamente incorreto afirmar isso mas não me importo. Existe sim. Mas essa suposta feiura não causa o estrago que alguns supõe causar.  A feiura é frequentemente desarmada por um espírito brilhante.  Ela perde o seu poder de estragar as coisas. Há  "algo mais" dentro da gente. 

Essa coisa interior que doravante chamaremos de "alma" tem sua existência comprovada justamente quando vamos a um funeral.   Na maioria das vezes a pessoa morta  não se parece muito com ela mesma quando viva. Já perceberam isso? Sempre achei estranho esse fenômeno.  

Um travesseiro cheio não se parece em nada com um travesseiro murcho. Tá bom, essa comparação não é muito boa mas dá pra entender o que eu quero dizer.

Uma pessoa tem a aparência completamente alterada quando está feliz, quando está com inveja, quando está com ódio, quando está dormindo, quando está doente, apaixonada, quando se ama, quando se odeia. Quem se acha feio, fica mais feio ainda. Ninguém precisa se achar bonito para ser menos feio. Basta que a pessoa não se importe com o julgamento dos outros, deixe esse concurso de beleza pra lá e trate de viver. Basta isso para se manifestar uma personalidade muito atraente.  

Por mais que a beleza seja relativa - e é - acho tolo demais ficar tentando convencer o feio de que ele é bonito. Pra quê? Pra ele continuar acreditando que a aparência é tudo?  O feio precisa ser convencido de que isso não importa e que a felicidade dele não depende dos aplausos alheios.  Ele precisa entender que precisa precisa deixar de ser superficial. 

Existem pessoas realmente atraentes, realmente interessantes e que  não são "bonitas". Ou são, mas daquela forma misteriosa, não da forma obvia.  Elas possuem um certo magnetismo que não sabemos explicar bem como funciona.  São bonitas mas não sabemos dizer "em quê" são bonitas.  Em suma há algo nelas que faz com que as tratemos como se fossem bonitas, que as desejemos como se fossem bonitas, que nos apaixonemos  como se fossem bonitas.  

Acho essas qualidades muito mais desejáveis do que uma aparência perfeita. Não vou ser hipócrita. Eu gostaria de ter uma aparência perfeita sim, mas esse é o tipo do tesouro que se deteriora rápido demais. É uma riqueza que se possui por muito pouco tempo.

Admito que alma também envelhece e até envilece. Mas isso não é uma sentença implacável.  Não está no script que tem que acontecer.

Para o corpo existem tratamentos, maquiagem, exercícios, roupas, remendos diversos. Para o embelezamento do espírito existe a convivência com as artes, com boas companhias, a espiritualidade sadia, o contágio do belo, a  prática do amor, o desenvolvimento do auto conhecimento, a generosidade, a prática da compaixão...

A feiura interior não é um destino de todos os mortais. Acho que por dentro talvez sejamos muito mais moldáveis do que por fora. 

Se eu pudesse escolher um tipo de beleza eu iria preferir a beleza que não desvanece. Eu ia preferir o charme irresistível que vem da alma e ofusca o corpo e tudo o mais.



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