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30 de dez. de 2024

Meu Instagram

 Dei uma revisitada nas postagens mais antigas do meu Instagram. Recomendo que você faça o mesmo e observe a sutil mudança pela qual passou ao longo dos anos.  Pode ser melancólico, pode ser engraçado. Certamente será interessante.

Notei que em um primeiro momento, sem entender muito qual a finalidade do Instagram, eu postava algumas coisas muito bobas, dando conta do meu dia-a-dia (hoje apaguei um monte delas).  A segunda fase foi a melhor:  tirava fotos muito aleatórias de coisas que eu achava interessantes ou só bonitas. Tirava foto mais das  cores do que das coisas em si. A cor da tarde, a cor da água através do vidro da garrafa, a cor da flor, do vaso, o reflexo do sou ou da lua.  Havia uma foto que tirei de dentro do meu carro, enquanto estava no lava jato. Fotografei aquele imenso escovão azul que limpava o para-brisas. Por que fiz isso? Porque me encantou a profundidade do azul turquesa do escovão! Você precisava ver.  E as gotículas de água espirrando dele, fugindo divertidamente para todos os lados.  Parecia haver vida ali. Estava tudo animado. E eu ali,  inerte e contemplativa curtindo minha fatia de felicidade. 

Amei aquela capacidade de me encantar com coisas simples e "invisíveis". Havia várias outras fotos semelhantes e acabei me perguntando se em algum momento o meu olhar se perdeu. A gente pode "perder o olhar" assim como as cozinheiras "perdem a mão."  É um perigo isso.

A  beleza está em todo lugar. O belo de verdade aparece sem querer, sem aviso e sem ajuda. 

Postei foto da minha chaleira branca por causa das suas curvas graciosas. Gostei também de um certo urubu que plainava no céu pouco antes de a chuva cair. Ele ia muito sem pressa e conseguiu parecer majestoso naquele momento. Todos sabemos que os urubus são feios mas aquele ali conseguiu driblar o estereótipo.   Apreciei também umas rabanadas, que de tão bem fritas mereceram registro. 

Depois veio a sequência de fotos minhas  e de familiares. Tantas fotos minhas eram desnecessárias ao mundo mas faz parte. Integram nossos costumes modernos. 

Depois disso fui amargando. Foi o que me pareceu.  Comecei com denuncias das injustiças da politica e não parei mais. Tudo foi ficando desconfortável de se acompanhar. Misturei essa amargura com diversas piadas e memes. Cobri também com camadas de versículos bíblicos,  aqueles que me traziam alívio pra isso tudo. Poderiam ajudar mais alguém.  Mas mesmo assim o meu Instagram parecia aflito, meio perdido e triste. Aos poucos isso foi me afligindo. Todo dia eu recebia notícias ruins da parte do governo e do resto do mundo, de tal forma que o belo aleatório parou de me tocar. Aparecia pouco e por ser pouco não conseguia aliviar a tensão da minha página.  Quando uma foto mais doce aparecia vinha com um ar meio deslocado, desconfortável no meio daquela tristezarada toda.   Foi quando comecei a sentir necessidade de ir embora.

Sair das redes sociais é ir embora.

Estou agora em ritmo de jejum. Não sei se quero voltar a me manifestar sobre assuntos da atualidade.  Centenas de pessoas que eu via nas telas e curtiam minhas postagens, sumiram.  Ou porque se cansaram de mim ou porque se cansaram da internet. Ou quem sabe "o sistema" nos cortou uns dos outros. Ficamos todos mais sós em nossas celas, falando para as paredes.  Todos esses motivos juntos formaram um caldo de desencanto que só o jejum pode curar. Preciso parar. 

Não entendi muito bem se estou só cansada ou enojada. Mas quero trazer de volta a Cristina das formiguinha, do bule branco, da foto da pamonha, da fogueira.  

Depois que o navio afunda nada mais importa.

Por enquanto é isso.



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