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3 de abr. de 2016

Room


Esse é o nome do filme O Quarto de Jack. Vá lá e assista.  Ele trata sobre a dificuldade de uma pessoa retomar a vida depois de um grande trauma - no caso sequestro. Sequestro não: rapto.

Pra mim o filme não é bem sobre isso.  Tive a impressão de que apenas quiseram ser originais e passar boa impressão. Passar "uma ideia mais evoluída", então falaram sobre o desejo politicamente correto de deixar pra lá o pensamento obsessivo por vingança e pensar no que realmente importa: tocar a vida em frente, reconstruir.  Tipo "tá, chega, bora pensar em outra coisa!"

Vi que algumas pessoas acharam que a história ficou "meio que pela metade" porque deu pouca trela para o destino do ofensor. Já para outros o filme foi perfeito porque saiu do lugar-comum.  Já existem milhares de filmes policiais que mostram sofrimento-investigação-redenção-justiça.  E esse filme quis ser diferente, quis falar sobre o day after.

Tá. Mas não há day after que aguente sem uma resposta ao monstro, sem uma punição. Não precisariam gastar meia hora nisso. Umas poucas cenas já trariam alívio à nossa sede de justiça. Foi meio que desumano deixar a gente no vácuo só pra posarem de mente evoluída. Eles nos deviam isso.

Não, o filme não deixou o bandido solto. Só o deixou "pra lá", tipo "a lei cuida dele, eu tenho mais o que fazer".  Esse pessoal tem sangue de barata mesmo. Não entendem que não dá pra seguir em frente com um mínimo de sanidade se não pudermos imaginar a cena memorável de um homem daquele sendo julgado, condenado e passando o resto da vida em uma cela de 2 por 2.

Perdão... Perdão...  Assisti agora pela manhã um vídeo justamente sobre perdão. Dá pra notar que estou gatinhando nessa área.   Nesse vídeo é mencionada a história inacreditável de Mandela perdoando pessoas que lhe impingiram sofrimentos inacreditáveis por anos. Quando penso nisso, tudo se contorce por dentro e me sinto um verme. Não sei como eu me sentiria no lugar dele. Embora eu saiba do fundo do meu coração que o rancor só maltrata quem o sente e que o perdão não é um prêmio para o ofensor, mas para o ofendido, ainda assim... Ai...

Gosto de imaginar que se eu passasse todos aqueles anos presa talvez eu até evoluiria. Entenderia que só se retirasse da alma toda a amargura é que eu não enlouqueceria. Talvez na juventude Mandela não tivesse capacidade nenhum de perdoar. Pode ser que ele tenha crescido em sabedoria justamente com o sofrimento. Talvez  em seus piores momentos ele tenha pedido misericórdia a Deus para que sua alma não apodrecesse de ódio e Deus pode ter ouvido suas preces. Talvez. Talvez eu até pudesse vir a ser Mandela se passasse por todo o processo "de purificação" e crescimento que ele passou.  Sei lá. Melhor pensar assim.

Dizem que a vingança não satisfaz e que a pessoa não sente nenhum tipo de alívio depois de praticá-la.  Alívio total e cura, só com o perdão. Mas na falta de perdão só a justiça consegue aliviar uma grande ferida. E na falta de justiça,.. só a vingança consolaria.

Não, não quero acreditar nisso. Não posso acreditar que as melhores pessoas que conheço estavam erradas e que as piores pessoas, essas sim, estivessem certas.

Jamais me vinguei de ninguém. Também jamais fui alvo de um crime dessa monta - como no filme ou como na vida de Mandela. Já fui alvo de outras injustiças e afrontas menores que não me inspiraram sentimento apocalípticos. Exceto quando fui assaltada.

O que eu fiquei sabendo, quando fui assaltada,  é que a raiva gera fantasias de vingança tão intensas quanto as fantasias sexuais. Absolutamente intensas e exigentes de realização.  E todos sabemos que as fantasias são o único consolo de quem não pode se realizar. No sexo a realização alivia, dá alegria, sensação de paz e plenitude. Será mesmo, então, que a realização das fantasias de vingança não tranquilizam do mesmo jeito? Ou depois do prazer da vingança, ao invés de vir a paz, vem a tristeza? E ao invés do sentimento de plenitude vem o sentimento de degradação?  E pra piorar dizem que "a vingança nunca é plena"; nunca satisfaz. Seria como um orgasmo que se anuncia mas nunca se completa.

Não sei, não sei... A única coisa que sei é que da minha torre de impotência já fantasiei vinganças que jamais pretendi realizar. Nunca me vinguei.  E espero jamais precisar descobrir na prática como essas coisas funcionam.


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