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4 de jan. de 2021

Bokeh - As pessoas *

Acabei de assistir o filme Bokeh. Logo em seguida tive uma ótima ideia: escrever a respeito. Mas alguém pensou nisso antes de mim, claro.  Dei uma procurada na internet para ler algo a respeito. Encontrei principalmente AQUI  mas também aqui, no "Dicas de Cinema":

"Não é um filme brilhante, arrebatador, de grandes emoções, mas é algo bem feito e que pode propiciar um estudo interessante da natureza humana. Das necessidades imediatas e daquelas que são fundamentais para o ser humano. O que é imprescindível, afinal?"

Bem, metade de tudo o que eu diria já estava lá, desconcertantemente exposto. Sendo assim fui poupada do trabalho exaustivo de primeiro explicar para vocês do quê se trata a película.  Ótimo, vamos  pular logo para os "finalmentes".

Possivelmente não era intenção do idealizador do filme que ele tivesse uma "moral da história".   Parece que ele só queria mesmo instigar.  Conseguiu. Mas fui além: achei uma "moral da história" por minha conta. Ei-la:

Por pior que pareça ser o nosso próximo, por mais desprezível que seja o vizinho e mais chatos os nossos parentes; por mais insuportáveis que sejam determinados povos e determinados conhecidos, a vida seria insuportável sem eles. Não necessariamente por motivos práticos de subsistência mas por questões emocionais.  O emocional sustenta tudo.

Quando pensamos em um cenário de fim do mundo só nos preocupamos com água, comida, abrigo, energia. Coisas práticas e palpáveis para a manutenção da vida. Tendo isso geralmente pensamos: problema resolvido. Pura ilusão.

Não havia na história um personagem solitário, mas um casal jovem e bonito com o mundo todo aos seus pés. Não bastava? Não seria o suficiente?  Juventude, beleza, companhia, amor, saúde, alimento, acesso livre a todos os bens mais cobiçados dessa vida, as roupas mais lindas, joia, todo o conforto e a possibilidade de morar na casa mais linda que eu escolhesse.  O que mais alguém poderia querer? É o auge da felicidade e da satisfação humana! É o retrato de uma vida perfeita! Não é?   Para a minha surpresa a resposta foi NÃO.  Se não existirem "as outras pessoas" esse mundo perfeito será o retrato do inferno.  Nada, absolutamente nada parece ter sentido sem "as outras pessoas".  

Antes desse filme eu ainda não havia percebido isso de jeito nenhum.  No filme a gente sente fome e sede de ver gente. Chega a ser aflitivo.  Nada, nada, nada faz sentido sem os vizinhos, os transeuntes anônimos, o taxista, o moleque correndo, a turma no bar, o avião passando, alguém falando no rádio, o vendedor de picolé, a colega que acena, a velhinha na janela, o ônibus cheio, as dez pessoas na marquise esperando a chuva passar, o cortejo fúnebre, a noiva atrasada, a fila na bilheteria, o bebê...  A vida tem que estar em todo lugar, não só na gente. E se não há outras pessoas nós vamos murchando por dentro até desejarmos a morte por puro desespero de solidão.

Estou até agora surpresa comigo mesma por ter demorado tanto a perceber isso.  Eu preciso das pessoas até mesmo para elas me encherem o saco porque  disso é feita vida.  Há uma dinâmica encantadora até no desagradável.  

Segundo a Bíblia morte não significa inexistência. Morte significa separação eterna.  E "morte eterna" (separação) é o outro nome do Inferno.  


Desliguei a televisão e me senti reconfortada por ver carros passando, gente na rua, mensagens no celular, vizinhos. Eu não aguentaria o peso de seguir em frente sem eles. Sem você.

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