Resolvi agora pegar no pé desses brasileiros que ficam corrigindo os gringos quando dizem "eu sou americano" ou eu moro "lá na América..."
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17 de fev. de 2022
Americano
30 de jan. de 2022
Natal não é uma festa cristã????
_"Ah mas Jesus não nasceu em 25 de dezembro!" (E daí?)
- "Mas a Bíblia não manda comemorar o Natal." (Mas proíbe?)
- "Natal foi instituído no dia da festa do "deus Sol (ou deus Mitra, sei lá) ". (E eu com isso?)
1) Pra começar: data não importa. É de uma irrelevância atroz se importar com isso e deixar de comemorar um evento tão significativa só porque não havia um cartório para declarar a data certinha em que Jesus nasceu. O Natal pode ser comemorado em agosto, outubro, janeiro. Não faz diferença alguma. Consagramos 25 de dezembro e tá bom demais. Se você tem data melhor para comemorar, fique a vontade.
2) A Bíblia não manda comemorar o Natal. Mas precisava? Francamente! Se não mandar você não move uma palha? Espontaneidade nem sonhar? Se não for no chicote...
Será que na lei de Deus havia a previsão para alguém sair pulando naquela procissão de Davi frente à Arca da Aliança? Será que havia uma lei bem clara dizendo que o ingresso para visitar o bebê Jesus seria um quilo de ouro ou de incenso ou de mirra?
Não havia nenhuma lei dizendo que Miriã deveria dançar de alegria depois da travessia do Mar Vermelho. Não havia nenhuma lei dizendo que derramar perfume nos pés do Senhor seria uma forma válida de adoração, mas aquela mulher o fez e Cristo aceitou. Não existia lei alguma dizendo que uma pessoa deveria ofertar a Deus tudo o que tinha e ficar sem nada. Mas aquela viúva pobre deu tudo o que tinha e Jesus aceitou. Foi o jeito que ela tinha de dizer "eu te amo, eu confio em ti." Precisava? Não. Mas foi válido porque foi por amor. O amor triunfa sobre a lei.
Sabe como Jesus chamou as pessoas que se limitam a fazer apenas o que a lei manda? SERVOS INÚTEIS. Porque só fazem o que foi mandado. São incapazes de ir além da lei e se deixar levar pelo coração. Servos inúteis desconhecem os arroubos do amor e não são capazes de fazer nada além do que foi ordenado. Em lugar algum da Bíblia está escrito que a gente não tem espaço para a ESPONTANEIDADE.
Também não há nada na Bíblia dizendo que eu tenho que comemorar o meu aniversário. Ninguém se preocupa com isso e acaba comemorando todos os anos.
Aliás você já pesquisou pra saber se seu aniversário vai na data de alguma festa pagã ou de alguma entidade da Umbanda? Cuidado! Mude a data ou Deus pode ficar furioso e te mandar para o quinto dos infernos!
Gente, ATÉ OS ANJOS COMEMORARAM O NATAL cantando glória a Deus nas alturas e paz na Terra aos seres humanos, de boa vontade! Caramba.
3) Mas e se realmente 25 de dezembro era dedicado a um tal "deus Mitra" e um imperador sem noção inventou de comemorar o Natal justamente nessa data? OOohhhh!
Quer dizer que minha intenção de adorar a Cristo em 25 de dezembro não conta? Não tem valor nenhum? O que conta mesmo é a intenção de um imperador que não sabe nem quem eu sou e que viveu há dois milênios atrás?
A data em questão pode ter sido dedicada num passado muito remoto a um tal "deus Mitra", deus sol , o raio que os parta. A pergunta é: o quê que eu tenho a ver com isso?
Era só o que faltava os cristãos terem que se preocupar com o calendário pagão pra saber se podem ou não podem dedicar uma festa ao Senhor. Isso sim é respeitar um deus pagão. Temos que respeitar as datas sagradas dos falsos deuses agora?
"Jesus, sinto muito mas chega pra lá que essa data já está reservada para o deus Mitra. Ele chegou primeiro então o direito é dele. Arrume outras datas para permitir que seus seguidores comemorem sua chegada ao mundo. Mas pesquise beeeeem para ter certeza de que não vai pegar outra data que já tenha dono, ok? "
A Bíblia diz que "TUDO é vosso, e vós de Cristo, e Cristo de Deus". Se os cristãos resolveram comemorar o Natal nesse dia, DANEM-SE os deuses pagãos! A data é nossa. "Ah mas no passado..." Dane-se o passado. "Não lembreis das coisas passadas nem considereis as antigas".
Hoje o sentido do Natal é a comemoração do advento do Messias. É a intenção que vale ou não é a intenção que vale? Por que eu deveria programar ou reprogramar a minha vida pelo calendário pagão de séculos atrás? TODOS OS DIAS pertencem ao Rei dos Reis e Senhor dos Senhores. Ele não é senhor só do sábado mas do calendário inteiro. Eles que arrumem outra data, se é que esse deus ainda tem devotos. Os anjos comemoraram o Natal. Os magos comemoraram. Os pastores comemoraram, os astros do céu também. Mas eu, serva de Cristo, deveria me preocupar mais com o sentido pagão da data do que com seu sentido cristão?
E o "mais engraçado" é que esse pessoal que detona o Natal geralmente são os mesmos que não veem nada de mais na Festa das Bruxas; sabe, aquela festa "simpática", decorada com caveiras, facas enterradas na cabeça, sangue, enforcamento, túmulo, morte, terror, ódio, aranhas, morcegos, homicídio, amputações, tortura, maldade, espíritos assassinos etc. Eles acham que é "legalismo"be "religiosidade tacanha" demonizar uma festa tão fofa quanto o Halloween porque tudo é só brincadeira.
Deixo aqui duas perguntas:
1- Quer dizer então que bastaria eu dizer que o Natal "é só um brincadeira" que a questão estaria resolvida? Se fosse de brincadeira a festa natalina deixaria de ser "pagã" e passaria a ser do bem?
2- Pra perguntinha: se o Natal é festa pagã, Halloween é O QUÊ?
Guerra, morte, tortura e moralidade
Doutor Jivago *
Dia desses assisti novamente um épico inesquecível: DOUTOR JIVAGO. História linda, romântica e cheia de dores. O tema é bem atual.
O que essa história tem de inquietante é a forma como joga na nossa cara o fato de que tudo se repete e parece que não há muito o que possamos fazer a respeito. Só nos resta duas coisas: não olhar, não raciocinar ou perceber tudo e sermos aqueles cachorros que latem enquanto a caravana passa.A história não é algo que mostra apenas por onde a sociedade andou. A história mostra para onde estamos indo e do quê o ser humano é capaz. Não, não evoluímos. A história é um profeta amaldiçoado que clama, adverte, implora, mas ninguém acredita. Por mais que a história grite a verdade a sociedade marcha para o mesmo abismo de sempre. Nesse caso enxergar é muito doloroso.
DOUTOR JIVAGO é um daqueles filmes que JAMAIS seria feito hoje. Nunca. Em época de lacração, mentira e propaganda "progressista", esse filme não teria vez. Ele é a denúncia de tudo o que atualmente insistem em encobrir. Filmes tem o poder de impregnar nossa mente e moldar opiniões. "Eles" sabem disso e é por isso que o cinema hoje vai em sentido contrário à verdade berrada por DOUTOR JIVAGO.
Há outros filmes que dizem a mesma coisa mas de forma diferente: ADEUS, MINHA CONCUBINA, O ÚLTIMO IMPERADOR DA CHINA e PRIMEIRO ELES MATARAM OS MEUS PAIS. São mais três exemplos de histórias que mostram o ódio irracional e assassino insuflado pelos "grandes" revolucionários.
Milhares de execuções, vidas destruídas, separações traumáticas, ódio, fome, desapropriação, gente complexada e ressentida que de repente se vê com poder ilimitado nas mãos enquanto outros são subjugados. Tudo em nome da "igualdade". Novos poderosos alçados ao poder agindo de forma infinitamente mais cruel do que os cruéis que eles destituíram. Os ricos passando a viver como os pobres, os pobres como miseráveis e os líderes revolucionários como deuses, donos do dinheiro e da vida das pessoas. Tudo em nome do "amor" e da "justiça social".
DOUTOR JIVAGO é um romance ambientado na revolução russa. Ele mostra que é necessário contar com o que as pessoas tem de pior para que uma revolução como aquela "dê certo".
Não me admira se um dia películas como essa sejam classificadas como "nocivas" e sumam das prateleiras, da internet, de todo lugar. Eles começam pressionando socialmente e terminam queimando livros e proibindo obras de arte.
Tudo tão previsível! O profeta grita, mas ninguém ouve.
16 de jan. de 2022
E por fim... *
Por fim, haja o que houver, permanece aquela coisa bem minha, lá dentro, firme como o ferro. É o nosso eu verdadeiro que ninguém consegue matar.
Há ainda por debaixo de todas as camadas do tempo aquela pessoa respirando, como um bebê não desejado sufocado dentro de um espartilho. Há ainda, e pra sempre, esse alguém que nunca pudemos ser e ao mesmo tempo jamais deixaremos de ser.
Pra sempre e enquanto houver vida, de vez em quando você pode esbarrar em você mesmo por aí. E vocês se olharão nos olhos. "- Por onde andou? Por que não se impôs?"
Enquanto houver a possibilidade de alguma música ou algum cheiro sutil te acordar esse ser virá a tona cheio de cobranças. Um lugar, uma cor de parede, uma camisa velha, um cheiro peculiar, um vulto livre naquela colina, um trem indo embora cheio de amargura. As duas pontas do tempo se encontram e você vai acabar esbarrando consigo mesmo. Deve doer.
"Ele", o seu EU adormecido, é como uma semente que vem à tona mesmo guardada em uma lata debaixo da cama. Ao menor sinal de sol, de ar e de vida pode abrir os olhos de novo.
Enquanto a gente é jovem há sempre o consolo do que pode vir a ser. A ideia de "algum dia talvez" ajuda a gente a viver. Sempre pode cair sobre nossas pobres cabeças algum milagre derradeiro. Pode haver algum cochilo dos vigilantes ou convergência de astros. Alguma coisa sempre pode dar tão errado mas tão errado que você de repente consiga pegar aquela ponta de fio solto e resgatar alguma coia para si.
Mas e quando muito tempo já passou? Dá até medo de que o milagre chegue atrasado. A pior coisaa do mundo é um milagre atrasado.
E se tudo der muito, muito, muito errado mesmo e a vida te jogar no colo aquela pluma perdida que andou vagando pelo mundo? E se ela vier? O que você faria depois de tanta demora? A dor desse atraso seria tão dolorosa que só a morte serviria de consolo.
É estranho demais esse sentir, de que tudo o que não foi era a sua verdade, no final das contas.
13 de abr. de 2021
Texto para quem admira os loucos , os rebeldes e os irreverentes
Inversão de valores. É disso que quero falar.
A palavra "rebelde" já foi um xingamento. Era um rótulo que ninguém queria para o seu filho. Quem contrataria um rebelde? Pra que serve uma pessoa que faz o que quer, ignora regras e só pensa em si? Rebeldia significa confronto, falta de disciplina, desprezo à autoridade. Um rebelde é uma péssima influência para os seus filhos. Mas agora querem perfumar a palavra. Deseja elevar a imagem de um artista medíocre? Diga que ele é um "grande rebelde". Pronto, o insignificante já vai ser visto com outros olhos.
Esse "elogio" perde toda a graça e passa a ser o que é, um xingamento, quando é VOCÊ que tem que tolerar o rebelde. O sujeito que não segue as regras da sua casa nem do colégio nem de nada. É o sabichão cheio de razão que não respeita a hora de silêncio do condomínio, não respeita a sua vaga na garagem, não respeita as regras da biblioteca nem de uma viagem de avião. O rebelde é sempre o "rei" do pedaço.
Da mesma forma chamar alguém de "irreverente" deixou de ser afronta e passou a ser elogio. O irreverente na verdade é só um grande mal educado. É alguém que não respeita os sentimentos dos outros, não sabe silenciar diante de assuntos delicados, não respeita luto, não respeita solenidades. Ser irreverente é não se importar em estar ferindo porque o conforto, a vontade e a diversão dele é só o que importa. Enquanto o rebelde confronta a lei, o irreverente agride de outra forma. Ele ataca não diretamente a norma, mas a sensibilidade dos outros.
Inventaram que ser irreverente é "charme". Só deixa de ser charme quanto a irreverência se volta contra você. Quando o sujeito faz piada com o que você considera sagrado ou com a sua doença, quando ele fala alto no velório, quando cochicha piadinha no enterro, quando você não consegue se concentrar em uma missa porque tem um mal educado conversando ou andando para lá e para cá, quando o mal educado vai ao casamento da sua filha de bermuda e chinelo, quando a beleza de uma cerimônia é avacalhada porque "o tal charmoso" era totalmente inconveniente em suas atitudes.
Outra coisa: vejo muita gente que jura que "ama mesmo é os loucos" e que gente "certinha" é muito chata. Não acho. Pois eu admiro que quero ao meu lado as pessoas corretas, que tem palavra, que sabem se comunicar, que raciocinam com lucidez e que não dá gargalhada histérica em restaurante. Quem "ama os loucos" deixa de amar rapidinho quando é ele que tem que aturar seus delírios e falta de bom senso. "O cara era um barato, era muito louco", por isso destruiu o carro da empresa, destratou o cliente, gastou todo o dinheiro em um projeto ridículo e agora quer que você o sustente. O "locão" era top. Por isso levou criança para um show de rock ao ar livre e choveu; deixou seu filho de 12 anos dirigir e deu merda; esqueceu um compromisso importante, deu o recado para a pessoa errada, destruiu seu apartamento dando festa, não tem responsabilidade. Sim, os loucos são adoráveis na casa e na vida dos outros. Quando a bagunça é na sua casa a coisa muda.
Concorda? Pois é. Então não diga que adora doido. O que você gosta é de gente divertida. Isso não tem nada a ver com ser maluco. E outra: lucidez nunca foi sinônimo de chatice. Uma pessoa que não aparece em sua casa sem avisar antes, que não entra no seu quarto sem permissão nem conta piadas picantes na hora errada, não é uma pessoa "certinha chata". É só uma pessoa educada. E ela pode ser uma pessoa muito interessante.
Aprenda o significado das palavras!
1- "Irreverente" não é sinônimo de descontraído. É só um sem noção que precisa se civilizar.
2- Ser "doido" não significa ser alegre ou divertido;
3- Educado não é sinônimo de chato.
4- "Rebelde" não é sinônimo de questionador. O rebelde não questiona "P.N." de forma sensata. Ele só é um mala que traz transtornos porque se recusa a seguir regras.
23 de mar. de 2021
O crochê das cartas *
22 de mar. de 2021
A moça dos pés falantes *

A MOÇA DOS PÉS FALANTES
Missa de formatura de filho de amigos. Lá estava eu na belíssima Basílica de Nazaré. O lugar é lindo e solene e eu coloquei a roupa mais linda e solene que meu dinheiro conseguiu comprar.
Em um momento de cumprimentos mútuos, antes de iniciar a cerimônia, deixei meu lugar e me dirigi ao final do templo para andar um pouco e me resguardar da balbúrdia daquela multidão inquieta.
Eu observava tudo “de rabo de olho”. Nos últimos bancos o que a gente menos vê é missa. Entre santos e pecadores notei, a uns quatro metros, um par de pernas morenas, cruzadas e imóveis. Era uma moça e era pobre.
Eu estava entediada com a missa que não começava. Minha mente, inquieta e criativa queria ter em quê pensar. Como um gato na coleira, minha imaginação começou a miar exigindo o direito de vagar entre os bancos e saber de tudo. “Meu gato” se soltou sozinho. Aí então comecei a romancear.
Aquela moça só pode ter sido levada por um forte impulso de amor pois não tinha roupa adequada para estar ali. Atribuí a ela, então, um enorme coração e um rosto puro e sereno (que eu não conseguia ver de onde estava). Continuei: atrás de si ela deveria trazer toda uma história de ternuras e sacrifícios pela família. O formando deveria ser um irmão mais novo. Ou primo que ela criou. Talvez não, por causa da idade. Quem sabe um irmão mais velho outrora perdido mas que venceu a bebida e conseguiu diploma. Ou um namorado pobre e sofrido? Não havia dúvidas de que para ela aquele momento era muito significativo, mais do que para todos os outros.
Pois ali estava ela, com a renúncia da sua vaidade. Destoava do grupo com suas roupas simples e visivelmente baratas. Nas unhas, esmalte de quinze dias. Os cabelos depois notei: não receberam cuidado especial. Foram lavados e secados ao vento como qualquer coisa selvagem da Amazônia. Assim era porque assim imaginei. Mas mais do que os supostos cabelos, seus pés falavam. E muito. Contaram-me do orgulho da formatura, do sonho realizado e da exigência do seu coração amante, que a fez arrastar-se até ali naquele estado simplérrimo. As sandálias eram empoeiradas e gastas. Chegou de ônibus, claro, com seus pés jovens e desidratados. Eram desertos morenos que falavam de distâncias. Pousavam na igreja como passarinhos na caverna, de olhos arregalados. Quem inspirava aquela moça a estar ali, sozinha, e tão desvestida de solenidade? Seus pés queriam explicar por que tinham todo o direito de estar ali, sem sandália dourada, em um desafio altivo a todos os trajes sociais.
Ela estava ali por alguém.
Começara a cerimônia. Entre um “amém” e um “glória a vós, Senhor” deduzi que sua coragem de deixar-se ver tão despojada viria do fato de ser bonita. Porque uma mulher jovem e bonita tem perdão para quase tudo nessa vida e toda mulher já nasce sabendo disso. Imaginei então um rosto moreno de pele lisa e levemente suada, olhos grandes e meio tristes, mas de cílios espessos. Boca fina e sem batom. Cintura fina, quadris imponentes. Uma flor d’água. A heroína do meu micro romance não poderia ser menos que isso. Resolvi então conferir.
Quando finalmente vi seu rosto acabaram-se as divagações. Não era bonita. A seu favor só havia a juventude e a altura. Mas meu romance não estava perdido. Era uma cabocla comum - mas amava! E isso a tornava especial. Retomei a história.
A moça dos pés falantes chorava sem parar. Que meiga! E mais: chorava sem contrair o rosto! Essa é uma arte que jamais consegui dominar: chorar sem fazer careta.
Antes
de mirá-la descaradamente só pude notar que chorava por causa do movimento
das mãos, que levou ao rosto várias vezes para tirar da rota
algumas lágrimas ligeiras. Ela o fazia com calma, sem preocupação
nenhuma de
esconder a emoção.
Ela
era alta mas nesse momento me pareceu mais alta ainda. Virou uma
palmeira.
Não era a única pessoa comovida.
Mas só ela saiu de casa com roupas de pobre, pegou ônibus com
sandálias surradas e entrou na Basílica de Nazaré de cabeça erguida.
Aquele
momento era tudo pra ela.
Decididamente ela era a heroína de
uma linda história de amor. Construí essa história e acredito nela. De coração.
11 de mar. de 2021
Hoje é o último dia da minha vida *
Essa noite sonhei que fui condenada à morte, então resolvia escrever minhas últimas palavras. As pessoas que eu mais amava iriam ler minhas declarações, inclusive minha mãe (que no sonho ainda não havia morrido). Isso aumentava muito a importância e a responsabilidade do que eu iria dizer.
A primeira frase já estava decidida. Seria "Hoje é o último dia da minha vida". Ponto. Daí eu começaria a desenvolver o resto.
Comecei a escrever mas logo joguei tudo fora porque o papel não era adequado. Depois recomecei porque eu estava em uma posição desconfortável e a letra estava saindo horrível. Depois joguei tudo fora de novo e recomecei porque a caneta estava falhando e acabou a tinta. E por várias vezes tentei escrever mas não passava da primeira folha. Eu queria algo marcante, sensível, poético, algo que resumisse minha vida e meus sentimentos e onde pudesse dizer tudo o que sinto por cada pessoa que amo. E também tinha que dar tempo de pedir desculpas e explicar certas coisas. Bem, isso tudo daria um livro mas eu só tinha um dia para escrever! "Amanhã" eu seria executada. Não daria tempo de fazer nada perfeito, nada com valor literário. Por fim, então, tomei a decisão correta: simplesmente escrever o que me viesse à mente sem me preocupar com nada mais. E se não desse tempo de terminar, paciência. Anne Frank também não "terminou seu diário" e mesmo assim ele se tornou um best seller. Não, nem Anne Frank eu queria ser. Queria apenas abrir o coração para o mundo e mostrar que existi.
Recomecei, por fim. Resoluta. Passei a registrar vários momentos da minha vida. Eu pulava de uma lembrança para outra, recomeçava, comentava sentimentos, mencionava pessoas. Não me importava mais com a ordem das coisas. Quem precisa de "ordem das coisas" no último dia da sua vida? Os pensamentos iam e vinham, tudo fluía imperfeitamente com deveria ser.
Em determinado momento eu não sabia mais se ainda estava acordada mesmo ou não. Porque eu continuava pensando, lembrando e selecionando com a minha mente tudo que deveria ser registrado. Em algum momento o sonho acabou mas eu continuava na cama com os mesmos pensamentos de escritora, de olhos fechados, redigindo mentalmente minhas memórias e declarações. Meio acordada, decidi que iria escrever tudo aquilo de verdade, em um caderno ou blog. Queria me lembrar de tudo, então eu entrava e saía do sonho sem saber se meus pensamentos eram uma continuação dele ou se eu ainda "estava lá".
A partir de algum momento indefinido acordei e fiquei pensando no significado daquele sonho. Ele não é a história de todos nós?Acho que é por isso que Deus não nos deixa voltar ao passado para remendar as coisas. Não é por maldade. Ele apenas sabe que não adiantaria. Ao retornar eu corrigiria erros antigos mas cometeria erros novos.
Siga em frente, Cristina. Apenas olhe para a frente e viva! Não vale a pena revisar infinitamente seus atos. O "livro da sua vida" não será perfeito. Não vai haver tempo de dizer tudo, justificar tudo nem consertar tudo.
Viver é escrever. Apenas "escreva" e quando o tempo acabar, acabou. Não se preocupe com o "carcereiro". Ele sabe a hora. Concentre-se no que você ainda tem de vida - e você tem pouco tempo! Abandone a pretensão boba de produzir uma obra prima. Apenas faça o seu melhor e deixe mensagens de amor. É o suficiente.
Estou começando a achar que esse sonho foi uma orientação do além.
10 de mar. de 2021
Maria *
Sou uma pessoa de sorte. A maior parte dos meus sonhos se realizaram. Houve frustrações homéricas, é bem verdade, mas não importa. Sou uma pessoa de sorte.
Todo mundo tem, ou teve, um sonho secreto que nunca aconteceu nem vai acontecer. Sério. Não vai. Sejamos realistas. Vou confessar um dos meus sonhos que, de tão bobinho e antigo, deveria ser esquecido. Mas como todos sabemos, sonhos entalados não morrem.
Era uma bobagem... mas era a MINHA bobagem romântica! Há algo de sagrado nisso.
Meu sonho era casar igual Maria no filme A Noviça Rebelde. Pronto, agora todo mundo já sabe.
Entrar na igreja como ela, oprimida por tanta felicidade, compenetradíssima ao som do "Processional and Maria" (https://open.spotify.com/track/13aKlygoQB1yeU4MEpW8in?si=Sa51jBRFTnCdBrR1Z-R69g).
Nossas bobagens preciosas não são para serem jogadas fora. Elas nos traduzem, denunciam nosso verdadeiro "eu". São nossos hieróglifos. Não se joga fora uma coisa assim.
E lá ia Maria, reluzente em sua simplicidade e despretensão de ser bonita. Resoluta deslizando pela igreja, soprada por aquele órgão imponente. Sozinha, sem pai nem mãe, deixando tudo para trás. Gloriosa e humilde. Maria.
Casei duas vezes mas em nenhuma delas essa música tocou. Por quê? Porque eu não disse a ninguém que queria. Por ser um sonho sagrado demais eu o guardei em meu compartimento secreto. Não poderia correr o risco de ouvir um "não". Ouvir um "Ah, não vai dar!" ia acabar comigo. Quem iria entender em plenitude o que aquilo significava para mim ? Melhor não arriscar.
O fato é que sempre fiz isso comigo mesma. Quando o desejo é muito intenso, não falo. Quando muito, insinuo. Porque se não acontece e a culpa é minha, eu me viro com meus fracassos. Mas se a culpa é do outro, temo que a mágoa seja eterna.
Bobagem. A mágoa foi eterna do mesmo jeito. Por que não tentei? Eu poderia ter casado ao som do Processional da Maria, ora!
Christopher Plummer *
Confissão:
(Christopher Plummer morreu aos 91 anos, em fevereiro de 2021)