Alguém postou no Facebook a foto acima com a seguinte legenda:"Gente, essa foto tem gerado polêmica nas redes sociais, pelo simples fato de um morador de rua ter pedido uma mãe para segurar seu bebê, na sua opinião essa mãe fez certo ou errado? O que vc faria se acontecesse com vc? Deixaria ele pegar seu filho no colo? Dê sua opinião".
Algumas pessoas elogiara. "Liiindo!' Outras xingaram por antecipação: quem ousasse criticar essa mãe já recebeu de pronto o rótulo de "preconceituoso miserável". Outro personagem perguntou, com seu coração puro e inocente "mas qual o problema?" Qual o problema? Esse que perguntou deve estar nesse momento com máscara na cara e com as mãos bem meladas de álcool gel.
Nunca vi uma geração tão carente de aceitação e aplausos.
Bem, eu não deixaria o morador de rua segurar meu bebê. Disseram "mas ele é gente!" Claro que é. É gente há dias sem banho e sabe-se lá com qual doença. Mora na rua. Não custa estar com uma pneumonia.
Esses que aplaudem são os mesmos que, quando chega uma visita em casa não deixam nem olhar para o bebê sem primeiro lavar as mãos. Beijar nem em sonho. Ferve tudo, até os pensamentos.
Sabemos ainda que vários desses moradores de rua são pessoas com problemas psiquiátricos. Tenho uma amiga que foi dar uma sopa para um deles e o sujeito lhe jogou no rosto o copo de sopa quente. Muitos são seres sofridos, atormentados, doentes. Alguns são agressivos. Vai saber!
Não estou aqui para jogar pedra nessa mãe. Se essa mãe já conhecia o morador de rua, se ele vivia nas redondezas e ela sabia que ele não era algum tipo de louco, menos mal. Mas mesmo assim acho errado.
Sou da opinião de que todo amor que demonstramos deve ser sempre às nossas custas. Seria melhor então não entregar o bebê mas compensar a negativa dando ela mesma dar um abraço no homem.
"Ah, ele é humano!" O bebê também é humano e precisa de proteção porque tem poucos anticorpos.
Enfim: eu não deixaria NENHUM ESTRANHO segurar meu bebê mesmo que estivesse cheiroso e engravatado.
Estive assistindo esses dias a um documentário sobre pessoas que arriscam a vida - e frequentemente a perdem - praticando os esportes mais malucos. Malabarismos impensáveis na bicicleta, numa corda através no Grand Canyon, esquiando em velocidades absurdas através de rochas, mergulhando sem cilindro abaixo de cem metros.
Não são loucos. Geralmente são pessoas quimicamente viciadas em uma substância que o próprio corpo produz: a adrenalina. Adrenalina vicia sim. E mata, porque não dá pra conseguir na farmácia nem na boca de fumo. É necessário arriscar a vida para sentir seu efeito na dosagem desejada.
Numa entrevista um jovem admitiu isso. Disse não saber viver sem aquele êxtase provocado pela aventura, pela proximidade da morte. Seu organismo era inundado por uma dose inebriante de adrenalina e era algo tão maravilhoso que simplesmente dava mais para viver sem. Em cada aventura ele procurava mais e mais. Por fim admitiu que sabia que iria morrer por causa disso, mas não conseguia parar. Mostrou uma foto como vários amigos companheiros de aventuras e foi apontando os que já haviam morrido. Vários. "O próximo pode ser eu". Ele estava ciente.
Bem, essa é só uma maneira de enxergar os "malucos radicais". Mas claro que eles não são só isso.
Eles são peças curiosas dessa engrenagem incrível formada pela totalidade dos seres humanos entrelaçados no mundo. Eles nos mostram as inúmeras possibilidades de existência. São o leque.
Assim como precisamos dos médicos, engenheiros, químicos e mecânicos, precisamos também, e desesperadamente, da leveza desses loucos que fazem evoluções dentro das ondas gigantescas. Precisamos de pessoas que nos mostrem na prática que a vida é muito mais variada e colorida do que conseguimos imaginar. Não podemos viver só de matemática. É enlouquecedor! Precisamos daquele cara que engole fogo, que escala a montanha, que se joga da montanha. Precisamos de quem nos diga que PODEMOS TRANSCENDER.
Fico feliz quando vejo que não sou só isso, mas de certa forma sou "aquilo" também porque "todos somos parte do gênero humano". Eu olho aquelas loucuras todas e por um instante brevíssimo ganho asas e me sinto... maior. Há como sair, saltar além. Há algo a mais dentro de nós. Eles nos provam que podemos ir além do que pensamos que somos. Não somos feitos só do que se pode explicar. Como a proximidade com a morte pode trazer tanto êxtase? Em qual momento mágico o perigo deixa de ser um monstro e se torna um companheiro de aventura?
Não sei de muita coisa. Não tenho respostas redondas mas sei que faço parte da mesma raça daqueles caras que dão quatro cambalhotas montados na motocicleta. De alguma maneira estou ali muito bem representada por eles.
Pode parecer que não, mas a vida precisa deles. Somos, como eu disse, uma engrenagem. Uma engrenagem muitíssimo sofisticada onde cada um desses loucos dão cor e sentido ao todo. Não é um sentido obvio. É um sentido mais fino, sutil, que se insinua no meio de todas as reentrâncias dessa máquina gigantesca. Eles são leves como metáforas. São a exuberância da vida sendo desenhada para a gente entender melhor.
Eles são um desafio e um convite. Quem não precisa disso?
A patroa pediu para a empregada passear com o cachorro. A empregada deixou seu filho aos cuidados da patroa. A patroa colocou o menino no elevador sozinho, para que ele retornasse ao apartamento. O menino, não sei como, caiu lá de cima e morreu.
Horrível. E porque foi horrível querem subverter a lei. Querem porque querem que o crime seja doloso. Não é. Ninguém põe uma criança no elevador porque quer que ela morra.
Este homicídio foi culposo sim. Isso não inocenta a patroa, que nesse caso deu o supremo azar de ser branca e mulher de político, isso em meio a um movimento de ódio aos brancos e aversão aos políticos.
Essa mulher cometeu um erro HORROROSO e vai pagar pela irresponsabilidade. Claro. Tem que ser assim. Só que não dá pra acreditar que no dia do crime ela acordou e pensou: "Nossa, hoje estou meio entediada. Acho que vou matar um moleque e destruir a vida dele, da mãe dele e a minha também."
Agora já querem enfiar racismo no meio. O crime já é suficientemente grave. Não precisa forçar a barra para piorar o que já é péssimo.
Vamos ser sensatos. OBVIAMENTE ela não queria matar. Deveria ser obvio que uma pessoa que mata por negligência, irresponsabilidade, imprudência etc não deve ser equiparada ao sujeito que te dá cinco facadas porque você olhou feio para ele.
Estão reclamando do pagamento da fiança, como se a justiça tivesse sido comprada. Gente, pagamento de fiança NÃO CANCELA A PENA nem inocenta ninguém. Apenas possibilita que o acusado responda em liberdade. Sim, também sou contra essa palhaçada legal mas ela existe há décadas. Não foi inventada hoje. Depois da condenação a mulher deverá ser presa.
Mas a prisão vai demorar. Sabe por quê? Porque para soltar o Lula criaram uma lei que beneficia um monte de criminoso. Atualmente a "justiça" só pode prender em última instância, quando não couber mais nenhum recurso. Criaram essa IMUNDÍCIE apenas para soltar o Lula. Um monte de mostro foi solto no mesmo trem da alegria e essa patroa que matou o menino também será beneficiada pela "lei Lula livre".
Ontem, final de tarde, eu transitava em um dos viadutos da cidade. Do carro olhei e vi o céu desistindo do turquesa como quem deixa o véu cair sem olhar pra trás. Escurecia devagarzinho, tudo meio embaçado por nuvens e poluição. Vi e amei os prédios. Pareciam tão imponentes ignorando o cansaço, a sujeira e o calor! Pareciam tão cônscios da necessidade de parecerem fortes e acolhedores para quem vem do trabalho!
Certamente as árvores parecem belas para os pássaros cansados. Parecem lindas também para a família dos macaquinhos que fazem delas seu lar. Acho que os prédios cumprem, para nós, o papel de árvores. São onde nos amontoamos, cansados, e abraçamos os outros macaquinhos para finalmente dormirmos.
O céu escurecido, as nuvens com cores indecisas, os primeiros postes acordando. Com meu olhar já lapidado pela cidade e sua estranha estética, achei bonitos os prédios assim, levantados contra o céu. Sim, são "árvores" rígidas onde nos amontoaremos com nossas famílias para proteção e descanso.
Num relance vi as primeiras janelas acendendo. Mentalmente entrei em uma cozinha, levantei a tampa da panela e quase senti o cheiro da sopa borbulhando. Passei na porta de um banheiro e senti também o cheiro dos vapores perfumados dos banhos das 19 horas.
Prédios não são bonitos como árvores, mas foi o que conseguimos. Daqui não ouvimos riachos. Nossos passos, em sua direção, não pisam folhas. Aqui a proximidade das pessoas se anuncia de outras formas.
Vistos de cima os prédios parecem menos maternais. Nesse caso formam magníficos labirintos onde, incrivelmente, ninguém se perde.
A beleza mora dentro, não fora da gente. Isso me leva a pensar que talvez as pessoas cruéis tenham seu senso de beleza diminuído devido ao processo de embrutecimento que as tornou más.
A maldade é a anti-beleza. Não acredito então que os maus sintam o mesmo que eu sinto quando olho as estrelas ou os prédios encardidos. Não que eu me destaque pela minha bondade. Acho que estou na média, talvez. Mas tem gente que se destaca pela maldade. Imagino que a vida subtraia do espírito dessas pessoas alguma coisa muito preciosa. Imagino que elas vão perdendo a capacidade de se emocionar com o belo. É como quem sangra: a pessoa vai amarelando, perdendo a graça.
Para piorar as coisas a ausência do senso de beleza só tornaria os cruéis mais cruéis ainda. A beleza nos enternece e a ausência dela, na vida ou no espírito, embrutece.
As pessoas bondosas desfrutam de mais beleza do que as más. Certamente. O mundo delas é diferente, é outra dimensão, impenetrável e incompreensível para os criéis. estes vivem em um submundo onde as cores mal são percebidas.
Não tenho provas de nada disso. Só sei daquela boniteza de final de tarde, dos prédios cansados, dos vapores noturnos de sabonete e sopa. Só sei do céu com as primeiras estrelas brotando das nuvens alaranjadas.
De onde saiu essa curiosa crença de que seria possível jogar moedas em um misterioso poço, o Poço dos Desejos, e então seu desejo seria realizado?
O Poço dos Desejos nos ensina algumas coisas:
1- Há muito tempo, talvez séculos, exista essa brincadeira de jogar moedas no poço - ou na Fonte dos Desejos. O desejo seria realizado por quem? Como? Quando? Ninguém sabe. Mesmo assim há poços ricos por aí. Então a lição número 1 é essa: você não precisa de todas as respostas. Por mais que queira, não precisa. Só precisa acreditar, jogar a moedinha e sair feliz, imaginando que plantou algo de bom para o futuro. 2- A graça do poço é o mistério. A vida sem mistério é meio fuleira.
3- Ensina a ter paciência - porque o pedido não é realizado na mesma hora. Você medita um pouco em frente ao poço, sonha, deseja de novo, idealiza, joga a moeda e vai pra casa. A coisa não acontece na hora. Pode levar um dia, uma semana, um mês. Então você fica em alerta, esperançosamente atento ao próximos acontecimentos. Qualquer coisa estranha ou inusitada pode ser a prova de que os poderes do poço são reais.
4- Ensina a não ser pão duro. Porque afinal de contas ninguém garante o seu investimento. Pode acontecer ou não e se não acontecer não tem como recuperar a moeda. Se você perde a moeda acaba aceitando tudo como brincadeira e deixa pra lá, porque ainda que o pedido não tenha se realizado valeu pagar para ter esperança por mais um tempinho.
5 - Ensina que por mais que você se ache muito realista e esclarecido, não consegue fugir das impressões humanas mais primitivas. Você não é muito melhor do que os antigos. O medo do escuro, o receio do cemitério a meia-noite, o olhar profundo do gato, o poço dos desejos, tudo são impressões fortes que nunca saem da gente. É se render e pronto. No máximo você diz que jogou a moda por brincadeira. Dentro de cada um de nós sempre vai haver espaço para o mistério. Aceite. No fundo no fundo a gente acredita nas coisas. Fomos programados para isso. Deve haver uma verdade aí. Ninguém cria uma fechadura para chave nenhuma.
6- Ensina a aceitar os fatos: não dá pra negociar com o poço. Não dá pra pagar depois. Cada moeda é uma semente que a gente não sabe se vai brotar. Isso é o início de um importante aprendizado para a vida. Todos os nossos investimentos são assim, tanto financeiros como emocionais. Jogamos moedas para o amor, para a amizade, para os negócios. Investimos sem garantia alguma, essa que é a verdade. Tudo o que temos são possibilidades. O importante é seguir sorrindo e pensar "tudo bem, tentei", ou "vai que cola!"
7- Ensina que o pensamento positivo, a esperança, são coisas que também acalentam o coração independentemente de a coisa desejada cair ou não no nosso colo. Os bons sentimentos são bens e si mesmos. O prazer da vida não reside apenas no que se realiza mas também no que se sente pelo caminho.
O que mais? Bem, se nada disso te convence sobre a utilidade do poço como professor de vida, tenho mais uma carta na manga: se eu posso abrir mão de uma parte do meu dinheiro para ter um prazer tão frágil e uma esperança tão sem sustentação, uma brincadeira barata, não seria muito mais sábio e prazeroso fazer das pessoas o nosso poço de desejos? E quem sabe investir nossos bens e esperanças não direcionadas a nós, mas a elas mesmas? Se "jogarmos moedas" e desejarmos a elas tudo de bom, do fundo do coração, quem sabe nosso desejo não se realiza?
É uma pena que nem todos os homens gostem de mulher.
Não estou me referindo aos homossexuais. Estou me referindo aos homens que gostam de fazer sexo com as mulheres mas não gostam das mulheres. É algo como gostar de pizza; você só gosta na hora da fome mas não quer passar o dia carregando uma pizza debaixo do braço.
Frequentemente vejo homossexuais que gostam mais das mulheres do que os heterossexuais.
Acho que o grande sonho das mulheres é que os hetero gostem tanto delas quanto os homo. Que eles gostem tanto do todo quanto gostam de algumas partes do corpo.
O filme Don Juan de Marco é lindíssimo e fala sobre esse coisa de REALMENTE gostar de mulher. Don Juan realmente as amava. É o extremo oposto do que vejo na maioria das vezes aqui, do meu posto de observação. Don Juan de Marco não representa o homem ideal; representa o que falta ao homem ideal, que é gostar da mulher toda e não em partes, como um frango de supermercado.
Para o personagem principal a mulher não era apenas um pedaço de carne a ser consumido mas uma jóia, um enigma, alguma coisa curiosa e encantadora, sempre desejável. Algo a se possuir, descobrir, guardar, ouvir, cheirar, ficar olhando mesmo depois da cópula. Para ele as mulheres eram como um fogo, um calor do qual era penoso se afastar. Ele queria todas. O sexo era apenas a maneira mais plena de se estar com uma mulher. Sexo para ele era deixar-se possuir para poder possuir também. Pode parecer sacana mas no filme conseguiram que isso tudo parecesse poético. Don Juan era tomado pelo torpor de encantamento de um colecionador.
Isso tudo nada tem a ver com amor em si, eu sei. E nenhuma mulher quer ser colecionada. Como já disse, Don Juan não é o homem ideal, apenas tem algo que falta à maioria. Talvez por isso as mulheres se deixem seduzir por ele: por ser alguém raro, que demonstra realmente apreciar a companhia feminina.
Gostar de sexo com uma mulher é muito diferente de gostar de mulher.
Tenho um conhecido que se gaba de suas aventuras sexuais. Adora dizer que saiu com fulana porque "precisava ejacular". Adora dizer que arranjou alguém, transou mas que agora nem lembra o nome. Ele não tem a menor noção do quanto ele é patético dizendo isso. Sua felicidade é estar entre os amigos dizendo coisas desse tipo, ou seja: confessando sem perceber a sua incapacidade de ser humano, completo. Sua incapacidade de ser mais do que um cão "cruzando" na rua. Desconfio de que nunca na vida ele soube o que é realmente uma mulher. De certa forma considero-o virgem. Lamentavelmente virgem. Esse tempo todo ele só se masturbou, não mais que isso. E sozinho, sem jamais perceber o prazer de uma real companhia.
Agora delicie-se com a música-tema do filme que mencionei:
Você Realmente Já Amou Uma Mulher? - Bryan Adams
Para realmente amar uma mulher, para compreendê-la
Você precisa conhecê-la profundamente por dentro
Ouvir cada pensamento, ver cada sonho
E dar-lhe asas quando ela quiser voar
Então, quando você se achar repousando
Desamparado nos braços dela
Você saberá que realmente ama uma mulher...
Refrão:
Quando você ama uma mulher
Você lhe diz que ela, realmente, é desejada
Quando você ama uma mulher
Você lhe diz que ela é a única
Pois ela precisa de alguém
Para dizer-lhe que vai durar para sempre.
Então diga-me: você realmente, realmente
Realmente já amou uma mulher?
Para realmente amar uma mulher, deixe-a segurar você
Até que você saiba como ela precisa ser tocada
Você precisa respirá-la, realmente saboreá-la
Até que você possa senti-la em seu sangue
E quando você puder ver, seus filhos que ainda não nasceram dentro dos olhos dela
Você saberá que realmente ama uma mulher
Refrão:
Quando você ama uma mulher
Você diz a ela o quanto ela é desejada
Quando você ama uma mulher
Você diz a ela, que ela é a única
Porque ela precisa de alguém
Para dizer a ela, que você irá estar sempre junto
Então me diga, você realmente
Realmente, realmente já amou uma mulher?
Você precisa dar-lhe um pouco de confiança
Segurá-la bem apertado, um pouco de ternura
Precisa tratá-la bem
Ela estará perto de você, cuidando bem de você
Você realmente precisa amar uma mulher. Yeah.
E quando você se achar repousando, desamparado nos braços dela
Você saberá que realmente ama uma mulher.
Refrão:
Quando você ama uma mulher,
Você diz a ela, o que ela realmente queria.
Quando você ama uma mulher,
Você diz a ela, que ela é a única.
Porque ela precisa de alguém
Para dizer a ela, que você irá estar sempre junto.
Estive pensando sobre a minha vida. Olhei para trás porque olhar para trás é inevitável em algum momento.
Tive uma vida boa sim, muito boa. Tive problemas, sofri. Claro. Não há quem não sofra nesse mundo. Tudo bem. Mas pensando bem... o que me trouxe mais dor? Qual foi a pedra, o espinho?
O que me trouxe mais dor foi, sem sombra de dúvidas, a intensidade quase insana de todos os meus desejos. Todos os meus desejos, sonhos, fantasias, projeções, tudo foi absolutamente excessivo, exagerado, diente. Entenda: eu não conseguia evitar. Se eu queria, queria demais, com as entranhas. Foi isso que estragou tudo porque a vida jamais conseguiu corresponder a isso. Nem a vida nem as pessoas. Colecionei angústias e frustrações indizíveis. Culpa de ninguém. Talvez nem culpa minha. Como eu poderia ser menos, sentir menos, ser outra? Como eu poderia domar meu coração? Domei por fora tudo o que pude domar mas por dentro é terra de ninguém e algum estrago foi inevitável. Eu posso dizer ao meu corpo "fique aqui" mas não pude colocar rédeas na alma. Ruim, muito ruim. Olho pra trás e quase tudo dói. Quase tudo o que lembro vem malecado com tantas angústias e ventos e tornados que é melhor deixar pra lá. Chega. Já deu. Passou, passou, viu? Passou.
Abraço o meu hoje. E peço a Deus que minha alma envelheça bem rápido e em paz . Eu mereço.
Um monte de gente já tentou definir ou formular um conceito de "velhice". Já disseram que a gente fica velho quando não quer mais aprender nada. Outros dizem que é quando a gente deixa de sonhar, ou deixa de amar, ou não tem mais curiosidades. Eu particularmente acho que a velhice se resume em "falta de disposição". É quando você não tem mais muita (nem pouca, talvez) disposição para ir a uma festa, ou participar de pequenas aventuras como tomar banho de chuva, pular um muro ou brincar de queimada. Você não sonha mais nem com romance por total "falta de saco" . Você já se apaixonou várias vezes e dá uma canseira imensa só de imaginar o desgaste emocional que vem de brinde. Não, já deu.
E as festas? Chega de festas. Você já sabe tudo o que vai acontecer. Conhece as caras que vão aparecer, as poses, os sorrisos formais. Já cansou de assistir as pessoas tentando parecer elegantes. Já cansou de ver idosos cochilando à mesa, crianças infernizando no salão, casais tentando passar uma boa imagem do relacionamento, garotas de olhos pretos quase como o Zorro. Não, chega. Se nada catastrófico ou inusitado acontecer, você já conhece o roteiro todo. Não que seja ruim mas o fato é que você já sabe, já viu, já cansou.
Eu nunca fiquei me analisando muito para saber a quantas anda o meu processo. Só que esses dias fui obrigada a fazê-lo ao observar uma amiga se manifestar em uma rede social. Ela contava que pretende dar uma guinada na vida, mudar tudo. Olhei pra mim e descobri que não quero mudar nada. Tá tudo bom demais. Não quero encheção de saco nem turbulências. Mau sinal.
Mau sinal mesmo? Será?
Ela falou de planos que deverão se materializar depois de uns cursos que está fazendo e tal e tal. Caramba, eu não sabia que ela estava com essa disposição toda! Então olhei pra mim: nada. Que contraste! Tentei ficar com inveja mas lembrei que não há nada que ela esteja fazendo que eu também não possa fazer se quiser. Aí que está: não quero.
Não quero mas confesso que queria querer. Queria estar com todo aquele ânimo. Quer dizer, eu acho que queria.
O fato é que balancei meu botijão e percebi que estou sem gás. É isso.
Quais meus sonhos hoje? Agora você me pegou. Sei lá. Quero viajar? Ok, quero sim. Mas já fiz umas viagens bem legais e esse "querer" de hoje não passa de um desejo chocho de pijama e pantufas. Está longe de ser um sonho.
O que mais? Sonhos românticos? Não. To casada, tô em paz. Já deu.
Sonhos... ? O que sinto está mais pra melancolia pelo que não foi do que desejo ou esperança de realizar. A essas alturas da minha vida já deu pra entender que o que não deu, não deu. Já foi.
E então? Tenho algumas coisas tênues que nem sei se podem ser chamadas de sonhos. E quer saber? Prefiro que seja assim. No passado eu desejava tudo com muito fome, muita sede de viver. Meus desejos todos doíam. Minha intensidade me machucava. Ser intensa pode parecer lindo mas na verdade é apenas DOLOROSO. É assim que me lembro de toda a minha juventude: como um rosário de desejos angustiantes. Não quero mais isso. Prefiro ficar com os meus "desejos tênues e voláteis". Quantos aos tais "sonhos", fique com eles pra você. Faça bom proveito.
Hoje simpatizei muito com um homem totalmente desconhecido só porque achei que ele era um homem bom. Eu assim o classifiquei porque eu estava, com ele e mais uns 30, em uma fila de embarque no aeroporto e com a mente ociosa. Esse é um ótimo contexto para começar a imaginar coisas. Imaginar coisas é o melhor que se pode fazer em uma fila.
Bem, esse era um homem bom, esforçado e trabalhador. Do tipo "pra casar". As ferramentas ele tinha, pelo menos. Como eu sei? Bem, ele estava logo ali, à minha frente. Prestativo e companheiro, carregava com muito cuidado e dificuldade um enorme pacote que até hoje desconheço o conteúdo. Aquele pacote parecia tão incômodo de transportar! A tarefa era manter aquele pacotão delicado com uma mão, manter o cartão de embarque e documento de identificação na outra mão e empurrar a malinha com o pé. E ele parecia tão cônscio da importância do que fazia e tão disposto a continuar fazendo sem reclamar, que isso tocou meu coração. Não parecia mal humorado, só um pouquinho cansado. Claro que era um bom homem! Do tipo que não se cansa fácil e, quando cansa, só nota depois. O melhor homem em um raio de cem metros, decidi. Gostei dele.
Vejam vocês o poder da imaginação. Do nada a gente rotula e determina quem presta e quem não presta, numa escaneada só.
O que havia dentro daquele pacote me instigou e a curiosidade incentiva a criatividade. Eram enfeites de Natal? Doces finos? Taças? Brinquedo desmontável? Roupa de bailarina? Patins? Patins não, não são frágeis nem volumosos. Fiquei curiosa mas me contive.
O fato é que ele se esforçava para que seja-lá-o-que-fosse não balançasse nem derramasse nem caísse ou esbarrasse em ninguém. Não parecia ser uma bomba. Ele não era do tipo que transporta bombas por aí. Não com aquela cara de pai de classe média baixa apaixonado pela filha de nove anos e pela esposa seis anos mais nova e um pouquinho obesa. ( Meu Deus de onde tirei tudo isso?!) .
Pois ele tocou meu coração. Não era bonito. Nem feio. Apenas comum, com cara de pai.
Certamente se eu estivesse no lugar dele estaria já com cara de enfado e dor nas costas. E se alguém encostasse para conversar eu aproveitaria para reclamar ( " não sei onde eu estava com a cabeça quando concordei em levar essa tralha. Fazer fazer favor para os outros é uma tremenda furada e eu estou cansada, meus braços doem e bla bla bla." )
Bem que eu queria que quando alguém me olhasse ao acaso pensasse consigo "nossa, que mulher legal! Gente fina mesmo!" Mas eu não coopero. Tanto não coopero que não me ofereci para ajudar o Homem Legal. Como castigo estou até hoje sem saber que raios ele carregava naquele pacotão. E vejam: eu estou escrevendo sobre ele mas ele não escreveu nada sobre mim. Ele é o cara legal, marido de ouro, enquanto eu não passo de uma viajante que fica rotulando os outros.
Bem, caso não tenham notado, essa é uma crônica de "preconceito do bem". Isso existe sim.