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1 de jul. de 2017
28 de jun. de 2017
Aquilo que você já sabe.
Eu mesma não queria abrir a janela ao amanhecer e ver cada dia o sol com uma cara diferente. Sol roxo. Sol cinza. Sol vermelho com bolinhas pretas. Sol amarelo com listras azuis. Não. Gosto mesmo é desse mesmo sol amarelinho e descabelado de todas as manhãs. Qual o problema?

Não entendo essa implicância que algumas pessoas tem com a rotina. Rotina é bom!
A pior implicância mesmo é implicar com a rotina da convivência a dois. Dá até vontade de rir quando vejo uma recém-casada dizendo que está sempre bolando alguma coisa nova para o relacionamento não cair na rotina. Ha ha ha. Só quero que ela venha conversar comigo daqui a trinta anos. Quem é que aguenta o peso de ter que estar bolando novidades para escapar da rotina do casamento? Se o casamento tende a ser insuportavelmente chato a ponto de você precisar ter essa preocupação, vou te dar um conselho: ao invés de ficar imaginando coisas caia fora. O bom casamento não é aquele com uma novidade por dia. O bom casamento é justamente aquele no qual duas pessoas se deliciam no que já conhecem de sobra e ainda assim continuam querendo. Êta coisa boa!
Bom do casamento (e de tudo o mais) é justamente a boa expectativa. Há coisa melhor do que deitar já sabendo que receberá aqueeeele cafuné de boa noite? Por quê esse cafuné tem que ser cada dia de um jeito, meu Deus do Céu? Outro exemplo: eu não gostaria de chegar ao meu restaurante favorito e encontrar cada vez o meu pedido com um gosto, um tempero, um corte diferente. NÃO! Eu quero comer exatamente aquilo que eu já comi na imaginação. Se mudarem alguma coisa eu reclamo.
O sucesso das franquias é justamente a pessoa entrar no estabelecimento já sabendo o que vai encontrar, sem invenções nem "criatividades".
Imagine-se em um casamento no qual você tenha a tarefa de toda a semana inventar um novo local para acasalamento (legal esse termo, né?), uma roupa diferente, uma música diferente, uma posição diferente... Acorda! Isso é impossível! Não há criatividade que aguente. Além do mais, nada que você inventar será mesmo diferente. Todas as posições "diferentes" já são manjadas desde que o mundo é mundo. E mesmo que para você elas sejam novidade, daqui a pouco tempo vão deixar de sê-lo. Ou você gosta de fruta ou não gosta. Decida.
Sério, as pessoas tem que entender que não existe a menor possibilidade de estar com alguém por trinta anos e ainda assim ter "novidades" toda a semana. E isso não é lamentável, mas desejável! Acho que a pior rotina é a de ter que ficar o tempo todo bolando um jeito de sair da rotina. Cruz-credo!
Há algo melhor do que entrar no quarto do filho sabendo que ele está lá, previsivelmente com saúde, que vai previsivelmente sorrir para você e previsivelmente te dar aquele abraço "manjado" de bom dia? Há algo melhor do que flagrar o olhar carinhoso da pessoa amada previsivelmente direcionado a vocÊ? Há algo melhor do que aquele mesmo cheirinho de café novo? Imagine uma cozinheira que fizesse um cafezinho todo dia com um gostinho diferente para não cair na rotina. Eu mandaria ela embora. Há algo melhor do que o bom e "manjado" orgasmo? Você já sabe como é, gosta de sentir aquilo e não precisa de inovação: só da boa e certeira re-re-re-repetição.
As melhores coisas dessa vida não comportam versão remix. Quero chegar em casa e torcer para encontrar sempre as mesmas coisas que amo. A felicidade está justamente em saber que as coisas que apreciamos continuarão sempre do mesmo jeito, no mesmo lugar. As dores da vida estão justamente na fatalidade de não conseguirmos manter pra sempre aquelas coisas que nos fazem felizes.
Acho que a felicidade é como um bom pudim de leite: simples e previsível. Quanto mais tentam incrementar um pudim, pior ele fica. Pode conferir.
Eu não consigo sentir água na boca por aquilo que desconheço o sabor. Quão doce é a expectativa da espera quando o desejado já foi mentalmente saboreado!
Quem muito muda é porque ainda não achou o ponto certo. No dia em que você comer um pudim perfeito você entenderá que qualquer cereja a mais é heresia.
13 de jun. de 2017
O primeiro passo
Foram necessários meses, muito meses até chegar aqui. Você pensou, sofreu, decidiu, voltou atrás, adiou de novo... Mas a hora é essa. Você vai jogar fora a triste capa do fracasso e mostrar ao mundo do que é capaz.
É no primeiro passo que a sua melhor versão se manifesta. Seu "eu" se levanta imponente como nunca, como jamais, e sai da toca com a cara lustrosa. Todas as certezas do mundo te saúdam, benevolentes. Tudo é fácil, os céus sorriem.
Agora olhe ao redor e perceba quantas pessoas não conseguiram ser como você. A maior parte não tem a sua coragem. Você é um exemplo sim! A maioria simplesmente não consegue dar o passo fundamental que determinará se haverá outros ou não.
O dia de hoje que determina todos os demais. Não importa o que vem lá na frente: se não houver o primeiro passo não haverá segundo nem terceiro. Você está criando o futuro! Tudo o que te abraçará lá no fim, na linha de chegada, está sendo forjado agora, agorinha, pela planta dos seus pés. Esse dia jamais se repetirá.
Vai ser maravilhoso dar o segundo, o terceiro, o milésimo passo. Mas nenhum se compara ao primeiro. Nem de longe! Nunca mais você vai sentir essa fé ingênua de quem começou o caminho e ainda não sentiu o peso do cansaço. Hoje você é um feixe de energia. Esse dia nasceu pra ser sozinho, único. Nunca mais você se sentirá tão forte quanto hoje. Dá uma certa melancolia saber disso.
Hoje você se pergunta, abismado, por que cargas d'água não tomou essa decisão antes. Hoje é a glória mas os próximos passos serão marcados pela persistência. Serão passos pesados e o mundo todo te puxará para trás. Você vai ter que ser teimoso, chato. Seus amigos lançarão à sua passagem confetes de desculpas. Dirão que a vida tem que ser leve. Elogiarão seu esforço mas apoiarão veementemente a sua desistência. São desculpas-confetes. Confetes efêmeros e irresponsáveis da parte dos que ignoram a glória do primeiro passo. Não aceite. Siga. Que vá ao lixo toda solidariedade ao fracasso.
Viva esse momento! Curta essa bem-aventurança. Nunca mais, nunca mais mesmo você terá a certeza do sucesso como tem hoje. Só existe um primeiro passo. Nunca mais a vitória vai te parecer tão ao alcance das mãos.
Todos nessa vida deveriam ter emoção semelhante. Esse é o seu momento. Não importa que seja efêmero; ele é todo seu.
10 de jun. de 2017
O mundo
Para começar : não existe uma "repressão do mundo contra o corpo imperfeito". Ninguém tá nem aí se você é gorda ou magra , pelancuda ou sarada. A única pessoa que te reprime , te critica e te odeia do jeito que você é , é você mesma. Só você tira a sua própria liberdade. Pare de culpar "o mundo" pelos seus complexos. A pessoa se acha uma merda e fica comprando "o mundo". Ninguém te impede de usar biquíni. Repito: o mundo não tá nem aí para você. E mesmo que tivesse, porque você deveria se importar?
A mesma coisa acontece com a dona de casa: ela tem inveja do trabalho do marido, acha que o que o que ele faz é superior ao que ela faz , se acha um zero à esquerda e por isso quer sair para trabalhar. O problema não é ela sair para trabalhar . O problema é a falta de autocrítica quando ela diz que faz isso "porque a sociedade não valoriza o seu trabalho".
Quem é "a sociedade"? Quem são essas pessoas tão importantes a ponto de me fazerem mudar todo o rumo da minha vida só para eu ser aplaudida por ela?
Conversa fiada . Ela é o seu proprii algoz. Ela mesma é que não se valoriza e fica jogando "para a sociedade". "O mundo" ... Por que os aplausos desse antro de pilantragem deveria importar?
21 de mai. de 2017
Sol e praça
O dia estava lindo, o sol pipocando no céu. Um exagero tropical. Que tal uma praia? Não. Praia perdeu um pouco a graça depois que tive melasma. Queria estar no sítio? Não, hoje não. E que tal um passeio de lancha? Hmmm... Outro dia. E ficar em casa, que tal? HHmmm... Não, eu queria estar em algum lugar.
18 de mai. de 2017
Esquecimentos
As únicas pessoas que não tem passado são as crianças. Eu voltaria a ser criança? Voltaria a acreditar e a perdoar facilmente? Dormiria sem preocupações ou sobressaltos? Seria uma pessoa boa e confiante? Seria feliz? Uma pessoa sem passado é uma criança e o fato de desconhecer, pelo esquecimento, todos os sofrimentos e perigos do mundo, me jogaria imediatamente no colo de todos os perigos e sofrimentos do mundo.
O esquecimento só seria bom em um mundo bom. Aqui, precisamente onde estamos, o esquecimento seria uma breve felicidade mas também uma imensa vulnerabilidade.
Na vida já tive medo de não conseguir esquecer e já tive medo de esquecer, perdendo assim meus pequenos tesouros do passado.
Ainda que as lembranças boas venham acompanhadas de lembranças ruins, como um colar de contas variadas, ainda assim eu o quero todo. Meu passado sou eu e tudo o que fui é o que me explica hoje e eu preciso dessa lógica. Além do mais, se um dia a felicidade se for, precisarei ainda mais me compensar com a felicidade passada. Não posso perder nada. Não posso esquecer.
15 de mai. de 2017
TROVA DO DIA
Essa me deprimiu

Sabe quando a gente começa a ler uma história crente de que se trata de um lance de auto ajuda? Pior: sabe quando a gente está precisando de uma bombada pra cima (no bom sentido)? Pois comecei a ler o texto VOANDO (no blog Beck em Palavras). Estava gostando. Jurava que teria um final tipo assim, cristão-esotérico-budista-contemplativo pendendo pro nirvana, mas...
"- Como se faz para voar tão alto? – perguntou o mais novo.
- Não sei explicar.
- Mas você acabou de voar! Eu tento todo dia, todos os dias, nunca consigo, sempre caio.
- Tem coisas que você simplesmente faz. Vem de dentro. É com o coração. Não se pára para pensar antes de fazer algumas coisas. Não é tudo que fazemos com o raciocínio. Eu nunca parei para pensar antes de voar. Enquanto estou voando, lá no alto, eu não penso em como fazer; simplesmente começo a fazer. E quando vejo, já voei.
- Eu queria tanto conseguir voar...
- Por isso não consegue. Fica ansioso demais.
- Então eu nunca voarei?
- Sim. Voará. Você só precisa aprender a relaxar.
- E só relaxar?
- E acreditar que você pode. Se você acreditar que poderá voar e relaxar, quando você não perceber, estará lá no alto, comigo. Tchau.
Alguns meses depois, deitado na grama de um parque qualquer, completamente relaxado, o mais novo ouvia uma música ao longe e começou a sonhar que estava voando. Sonhou com tanta força, que acreditou que fosse verdade. Quando deu por si, continuava deitado na grama. Ele nunca voou."
P.Q.P! Fiquei mal. Até parece cruzamento de Caetano Veloso com Paulo Coelho. Será que nunca vou voar?
12 de mai. de 2017
Parábola do amor (atenção: esse texto não é de minha autoria!)

Ao semear a sua semente, uma caiu à beira do coração, e, na mesma noite veio um sedutor e a roubou.
Outra caiu num coração que parecia estar aberto. Mas as muitas alternativas logo inibiram a semente, pois, no fundo, o coração não queria se deixar penetrar pelo amor.
Outra semente caiu entre muitos concorrentes. Sementes de todos os tipos de espinho, e que pegam em qualquer lugar, especialmente no chão seco, carente e desértico. Assim, sufocada, a semente do amor morreu antes de morrer no chão da umidade fértil.
Enfim, uma das sementes caiu num coração que queria amar, e que estava limpo e preparado; pois, nele, não havia sementes de enganos. Esse amou, foi feliz, e conheceu o sentido do encontro entre um homem e uma mulher.
Quem tem coração para sentir e entender, que sinta e entenda!
Caio Fábio
10 de mai. de 2017
Junho de 1983
Na verdade jamais cheguei a desejar, como outras pessoas, ser novamente criança. Essa vontade nunca tive por diversas razões. Só que quando entrei naquela sala tudo me emocionou.
Lá não havia nada que pudesse ser considerado bonito: era uma sala de madeira com a pintura gasta. O chão igualmente rústico. A mesa da professora era improvisada por outras duas mesinhas menores juntas, cheias de livros. Um ventilador de teto, cadeiras de fórmica azul claro com braço para escrita e o mais interessante: na sala toda um cheiro inexplicável de criança. Exatamente isso.
O cheiro foi o que mais me impressionou e emocionou também. Não me refiro a colônia com cheirinho de bebê. Era muito mais que isso: cheiro de inocência, de gente limpa do pó do tempo, de vida explodindo, de sorriso sincero, de flor abrindo, de dia amanhecendo, capim fresco, pão quentinho, gotinhas de suor na testa macia; cheiro de gente que não partilha da podridão do mundo. Era O Perfume, O Cheiro.
Não sei como essas criaturinhas engraçadas e acesas conseguem deixar rastros tão profundos por onde passam. Foi então que lembrei nitidamente do que fui e não sei como ou quando deixei de ser. Até aquela data eu ainda não havia notado o tempo passar. Estava distraída demais com meus afazeres. Ainda não havia incorporado esse costume de olhar vez por outra no retrovisor da vida.
Naquele dia me assustei. Não com um novo sentimento, mas em perceber o quanto havia mudado a minha maneira de enxergar tudo ao meu redor. Em qual momento fatídico aquele “espírito de criança” caiu fora? Como consegui afugentá-lo? Só sei que por alguns instantes “ele” voltou. Pude sentir! Não precisei fechar os olhos.
Acho que ninguém ali notou o momento mágico em que novamente fui tomada. Pelo que? Fui tomada. Senti de novo aqueles sopros do passado: o esmero em arrumar o material na pasta, a alegria do uniforme novo, a impaciência para que chegasse logo a hora de ir ao colégio, os passos largos de manhãzinha, o prazer de sentir o cheirinho dos livros e cadernos novos recém-encapados. Deu até vontade de chorar. Inesparada viagem!
Outras lembranças doídas também vieram, assim como o vento traz a poeira. Lembrei da insegurança, da timidez, da sensação de não ser aceita. Lembrei de que era desajeitada e feia mas não sofri. Cenas e cenas saltavam em minha mente como se estivessem séculos espremidas no túmulo e de repente agarrassem uma chance única de voltar à vida para serem sentidas novamente. Vi os primeiros sinais da subserviência masculina diante da beleza feminina - as meninas bonitas, os meninos iniciantes... Tudo passageiro, frágil e repetido.
Disso tudo lembrei e senti um grande carinho, de mãe para filha, por aquela menina que fui: sensível, insegura e sonhadora.
Estranhamente tive a impressão de que aquela era a minha sala de aula, aqueles bonecos e letras sorridentes estavam ali para mim. Senti muita vontade de chorar, um nó na garganta, mas ninguém entenderia essa atitude ali, numa reunião de pais e mestres. Emoção estranha, difícil de compartilhar.
Voltei a mim, vim para casa com minha enorme barriga de grávida. Pela primeira vez na vida tive saudade da minha infância.
7 de mai. de 2017
Eu sou superior. E você?
De repente baixa na cabeça das pessoas um certo tipo de unanimidade invencível e irritante. Todos passam a falar a mesma coisa, ter a mesma opinião e fechar os ouvidos a qualquer argumentação contrária.
De quê estou falando, mais especificamente? Dessa mania chatésima de desmerecer a raça humana. Para começar vou logo dizendo: gosto dos seres humanos, tá? E sei que estou nadando contra a corrente. Agora é chique dizer que os humanos desaparecerão do planeta e isso é bem feito pra nós! Que somos maus, burros e nada presta.
Bem feito por quê? Até parece que somos a única espécie animal a desaparecer ou prestes a isso. Um número incontável de animais levaram o farelo ao longo dos milênios e ninguém diz "bem feito!" Qual o pecado que eles cometeram? Comeram muito hambúrguer com Coca-Cola? Mataram seus semelhantes? Porque nosso possível desaparecimento é castigo pelos nossos atos mas o dos mamutes não? O quê que o mamute tem que eu não tenho? (Não responda.)
E está na moda desmerecer até a nossa capacidade intelectual. Há os que simplesmente a negam! É mole? Há hereges por aí (fogueira neles!) afirmando que a formiga é mais inteligente do que o homem porque ela sabe se organizar maravilhosamente bem, que nenhum de nós sabe fazer uma teia como uma aranha, portanto seria um erro dizer que somos superiores a elas, blá blá blá. Quando a bobagem é muito grande, mais extensa e trabalhosa fica a defesa. Por isso é que tem gente que parte logo para a ignorância.
Mande uma aranha fazer um pudim, um avião, um perfume ou lapidar uma pedra. Mande! Mande a aranha se esforçar para ser "uma aranha melhor e mais humana" ou "pior e mais desumana". Nada. nenhum tipo de apelo entra naquela cabeça peluda. Ela não tem capacidade para ser nem melhor nem pior do que é. As aranhas, assim como os pássaros e peixes, são umas lindas maquininhas, interessantes mesmo, mas não passam daquilo. Podem até ter sentimento mas até isso é limitado e não sujeito a raciocínio ou constatação de nenhuma espécie. Se um cachorro te ama (ai que liiiindo) e você morre, ele pode morrer seco no portão da sua casa esperando o retorno do dono que jamais retornará. Sabe o que é isso? Falta de capacidade de entender. Ele nada sabe sobre o tempo ou a transitoriedade da vida. Sobra um apego assim, infindo, sem raciocínio, sem opção, que você acha lindo mas é apenas um tipo de pane.
Nós temos capacidade de nos tornar anjos ou demônios. Há um mundo de possibilidades dentro de nós e isso é sinônimo de riqueza. Podemos criar e destruir, amar e odiar.
Pense numa máquina de costura que faça pontos absolutamente precisos. Você, ser humano, jamais conseguirá costurar como ela. Jamais será tão exato. Isso faz daquela máquina "um ser superior" a você? Pois é. Aí entram baleias e golfinhos, que encontram o caminho de casa no fundo dos oceanos. São máquinas de costura. Jamais dirigirão um carro. Só sabem rebolar pelos oceanos. Chip único.
Gosto desses bichinhos e clamo pela sua preservação mas não dá pra comparar com os humanos. Somos lindos, criativos, misteriosos e imprevisíveis. E a imprevisibilidade é fundamental à beleza. Em toda beleza há surpresa, há um "OH!" exclamando aos sentidos. Qual surpresa esperar de uma abelha? Pode até haver uma aqui ou ali que voe em quadrado, ou em círculo, ou que, no vôo, saiba escrever I Love You no céu (pouco provável) mas nada que se compare aos deuses patinadores das olimpíadas de inverno. Não que o vôo das abelhas seja inferior, mas é que nós criamos e aprendemos mas elas não. O chip delas é desse tamaninho. Foram programadas para só fazerem aquilo, para sempre.
Sinceramente sinto-me ofendida ao me compararem com uma minhoca. Já o fizeram e nem sou magrinha. Pessoas simplórias quando me ouvem dizer que sou superiores àquelas geléias rastejantes, criticam! E entendem, equivocadamente, que estou apregoando que temos o direito de destruir tudo o que não seja humano só porque somos superiores. Não estou dizendo isso e se para fundamentar atos bárbaros alguém já se utilizou da tese da superioridade humana eu não tenho nada a ver com isso. Ser superior é ter também a capacidade de preservar.
... "Nós não preservamos". Não? Preservamos sim. Uns destroem, outros preservam. Eis aí a nossa variedade! Lutamos, doutrinamos o outro... e nessa elasticidade está toda a beleza de não se saber como será amanhã nem como cada qual reagirá. Daqui a cem anos os gatos estarão fazendo as mesmas gatarias, os cavalos cavalarão do mesmo jeito mas nós... quem sabe? Podemos resolver ter os cabelos azuis e dentes fosforescentes. É só querermos. Temos o poder e a tecnologia para isso. Eles não.
Já ouvi um mané dizer que o fato de usarmos tênis e roupas é prova inequívoca da nossa inferioridade, já que as lagartixas não precisam disso. Ai meu Deus, iluminai tais seres! Precisamente por não poderem se adaptar a tudo é que as lagartixas não podem viver em qualquer lugar. Nós podemos,
Não precisamos de tênis: usamos. É diferente. Esses acessórios são ferramentas para ganharmos o mundo. Poderíamos viver e morrer em climas amenos, mas como somos escrotos, não nos conformamos. Preferimos explorar e obrigar os ambientes difíceis a nos engolirem. Um urso polar não pode vir para cá. Ele morre. Mas nós podemos ir para onde ele está.
Com os irracionais funciona assim: uns só vivem se for no frio, outros só se for no quente. Há outros ainda, mais frescos, que só se dão bem se for no quente-frio alternados. Uns só comem folhas e se não tiver folhas, morrem. Outros só encaram carne e se não tiver na prateleira da selva, adeus. Nós não. Nós nos adaptamos. Tá frio? Meta-lhe casaco. Tá quente? Todo mundo pelado! O clima se alterna? Não tem problema: arranjamos dois tipos de guarda-roupa, e assim nos espalhamos sobre a superfície da terra fazendo o que dá na cabeça.
"O que dá na cabeça" é sinônimo de "destruir", alguém diria. Não necessariamente destruir. "Alterar" seria o termo mais correto. Mas você já ouviu dizer que ou destruimos as formigas ou elas destroem o mundo? Eu já vi um documentário a respeito. No quesito "destruição" não somos piores do que as formigas. Qualquer predador que se multiplique incontrolavelmente vai acabar alterando drasticamente o meio ambiente.
Quem te garante que se houvesse fortes motivos as lindas gaivotas não destruiriam o mundo? Você tem garantia disso? Se para sobreviverem elas precisassem adquirir ouro ou a pele dos outros animais você acha que a gaivota pensaria duas vezes? Fala sério!
O leão não pensa duas vezes: tá com fome, te come. Nós é que temos essa conversa mole de ter que comer folha para preservar. Eles não pensam nisso. O passarinho está se lixando se a minhoca tem ou não família, se existem minhoquinhas famintas em casa esperando por elas. Bobeou, dançou.
Pense no cupim. Vá pregar para ele o seu discurso de não-destruição. Vá lá! Ele não quer saber! Deu chance? Adeus maloca! Não, não somos só nós que destruimos. Tudo o que vive caminha para a morte e leva consigo um monte de coisas. A diferença é que somos suscetíveis a discursos, propagandas verdes. Eles não.
Há quem diga que "destruir com consciência" é pior do que "destruir com inocência", como os irracionais. Bem, esse juízo de valor fica por conta de cada um. Só digo o seguinte: a consciência é a liberdade para fazer ou não. Escolher, afinal. Eles não têm isso. Deram corda no jacaré e ele só consegue fazer todo tempo a mesma coisa. Sabe, não ocorre nenhuma idéia mais interessante na cabeça dele.
Acho bom você concordar comigo porque tenho um lado irracional, portanto "muito superior", que instintivamente cai com as garras em cima dos opositores.