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27 de jul. de 2013

Manual para dividir o mesmo teto (e as tarefas domésticas)

Confesso que gosto de, vez por outra, ler a revista Marie Clair. Dia desses deparei-me com um artigo demonstrando a angústia das mulheres ao descobrirem o quanto é difícil dividir o "apê".
A coluna foi escrita por um homem. Vamos ver o que ele pensa a respeito: 

"Dia desses uma leitora escreveu. Disse que estava cansada. Cansada de escalar as montanhas de meias sujas. Cansada de equilibrar o Everest de louças na pia. Cansada de tropeçar nas bolotas de poeira. Cansada do que é a vida de uma mulher que mora com um homem. E ela queria saber.
Saber o que fazer para ele aprender a linda dádiva de ser um homem alvejante, um rapaz aspirador, um garotão Bombril. O que fazer? ...   Morar junto é convidar um desastre para a janta. Tem tudo pra dar errado. E é aí que está toda a graça. Eu disse logo no início que gostaria de fazer uma conta. Ei-la: consultados os matemáticos e as calculadoras solares mais precisas, chego à conclusão de que a probabilidade de uma rotina amorosa dar certo é de uns 3%.  Moça e moço não foram feitos pra conviver.


Mas calma, Cocadinha! Guarde o tijolo na bolsa. A graça toda está nisso aí de que, com tudo pra dar errado, é a esperança de que dê certo que fará com que você e ele dêem uma chance ao amor. Digo isso porque, entendam: homens não são mulheres. Tirando as numerosas exceções de praxe, a verdade é que um macho tem uma tolerância às sujeirinhas da vida sensivelmente superior à das fêmeas.


Um homem solto na natureza, se estiver apenas sob os olhares de seus iguais, trocará menos cuecas, tomará menos banhos, passará menos perfumes, atirará toalhas ao céu, andará o tempo todo de ceroulas e reaproveitará um garfo sujo de queijo se a comida que estiver à mesa for… queijo. É exagero! É exagero! Mas tem fundamento! Tem sim!


A DICA:


Ó. Um homem casado, em cativeiro, entende que precisa abrir mão de sua selvageria interior. Juro que a gente tenta. Ainda assim, dobrar a meia em três partes, combinar o jogo de fronhas com a tonalidade do lençol, respeitar que na gaveta de bermuda só durmam bermudas, isso tudo é difícil, é duro, meio sem sentido.


Você quer saber o que fazer para com que ele dome o Cascão que reside no âmago masculino? Reza e conversa. Não briga nem obriga. Ou ele vai empurrar a chateação pra debaixo do tapete (um tapete que já guarda outras mágoas, uns recibos de supermercado amassados e uns pacotes de bolacha usados).
Explica pro rapaz que toda sujeira tem um limite: que mosquitinho voando em casa não é bom sinal. Mas também faça um esforço contrário. Entenda que todo homem, no fundo (mas num fundo meio raso), acha que mulher exagera. Que não precisa de tanto. Que a casa ter um pozinho de leve, um armário um pouco fora de ordem ou uma toalha limpa guardada junto a um edredom não é assim um crime previsto no Pentateuco. Eu sou a favor da doçura. Da vida boa, da vida leve. Depende dele, mas depende também de você. Sossegar o espanador é uma arte de equilíbrio difícil, mas possível. É fazer sua vida a dois ser um gole de limonada, e não de Diabo Verde."

O que é que você acha disso?

23 de jul. de 2013

Pra quê serve um vândalo? *

Se até cocô serve como adubo, não deveríamos esperar que os vândalos, que tanto se aproximam dessa matéria fertilizadora, não servissem para nada:

1-  Eles servem para incomodar também o Governo. Eles, os neandertais da bandidagem, em sua forma primitiva de fazer o mal, sempre foram o nosso calo. Nosso, só nosso. A nobreza geralmente escapa porque vive segura, armada e não anda de ônibus. Antes só destruíam os nossos bens particulares. Se continuassem assim jamais preocupariam o poder. Agora preocupam porque passaram a destruir o patrimônio público e isso traz em si uma ameaça sutil: eles podem "se empolgar", já que não são detidos com rigor, e aí avançar até chegarem nos intocáveis.

2- Servem para mostrar o verdadeiro Brasil. É, o verdadeiro Brasil é bem menos bonito do que nas fotos. Aquela massa morena e simpática, amistosa e de bunda grande, não existe. O Brasil mudou de cara faz tempo, meu amigo. Nós hoje somos essa coisa feia aí, que você vê nos noticiários. O crime ganhou força, e ramificou. Estamos em metástase. Em outras palavras: uma multidão ordeira NÃO EXPRESSA o que somos hoje. Usando os termos da moda: uma multidão ordeira não nos representa. Passeata sem vândalos é o mesmo que capital brasileira sem morador de rua nem trombadinha: faz parte. É muito artificial recolher e amontoar os mendigos longe dos pontos turísticos, não é? Pois então isso se aplica também a esse caso. Não somos um país pacífico mas perigoso, ameaçador, cheio de gente ignorante e violenta. Você pode esconder um câncer por muito tempo mas não para sempre.

3- Eles servem para mostrar ao mundo o inferno onde vivemos. Esses caras que queimam carros e quebram vidraças estão nos atazanando há décadas. Não surgiram ontem, do nada. A única diferença é que agora estão atuando em horário nobre. Se não podemos ir ao trabalho em paz, ir à faculdade em paz, à praça, ao supermercado, à casa do vizinho em paz,  por que diabos você acha que iríamos conseguir fazer passeata em paz?

4- Servem para pararmos com nossas pieguices idiotas e passarmos a pensar seriamente em como vamos tratar esse tipo de gente. Porque se não fizermos nada eles vão se multiplicar mais rápido ainda.  Temos coragem de mudar? Ou vamos continuar apostando nas teoriazinhas psico-jurídicas que nos colocaram nesse caos?

Só os cidadãos de bem sabem o que é respeito. Bandido só conhece a linguagem do medo.

5- Servem para pararmos com a babaquice de querer entender completamente a mente dos criminosos. Temos que nos dedicar primeiramente em tentar entender as necessidades das pessoas de bem e nos empenharmos em atendê-las. Não adianta os babacas "empaletozados" fazerem seminários sobre violência se os bandidos não são razoáveis! O cara entrega a carteira mas o assaltante dá-lhe três tiros só pra não perder a viagem. E aí, vai tentar teorizar? Eles derrubam monumentos sem esperar lucrar nada com isso, só pela adrenalina. Queimam carros de quem não lhes fez mal algum!  Não tem lógica, são como animais irracionais! Desistam dessa arrogância intelectual e metam a mão na massa!.

6- Servem para nós mesmos, gentinha comum que não governa nem a própria vida, para acordarmos também e pararmos com essa palhaçada de acolher passivamente teorias disseminadas por alguns legisladores  que foram colocados lá pelo crime organizado, gente. Que tal deixarmos de ser burros?

Sim, eles são uma espécie de esterco. Enquanto não conseguimos nos livrar deles, vamos pelo menos considerar que alguma coisa aproveitável pode advir de tanta barbaridade.

Teoria em gestação. Aceito discordâncias.

19 de jul. de 2013

Mulheres desesperadas

Há coisas que me deixam constrangida no universo feminino. Como se não bastasse essa coisa patética de se reduzir a mico de circo em shows  eróticos para entreter homens, ainda temos que testemunhar outras formas de detonação da imagem feminina.

Um exemplo de conduta detonadora de imagem é aquele lance de confundir sensualidade com baixaria. É tentar ser sexy mas errar a conta e cair de quatro na vulgaridade.  Vocês nunca conheceram ninguém que vive mostrando a calcinha "sem querer"? Pois é. Outro exemplo são as mulheres que dão uma de "loja em liquidação" : em uma roda de amigos de vez em quando dão a entender que "são da onda", topam tudo, em todas as posições e sem compromisso.  Pô! Pode até ser verdade, mas precisa anunciar no megafone? Pode também ser só "brincadeirinha" mas os homens registram a como prova incontestável de desespero. Resultado: ou nem chegam perto ou chegam, trocam o óleo e depois caem fora rapidinho.

Detalhe: amigo, por mais amigo que seja, é homem em primeiro lugar. Ele não vai refrescar o julgamento só por causa dos laços de amizade.

Essas e outras atitudes detonam a imagem da mulher.  Não, caras companheiras! Um pouco de orgulho faz muito bem para a pele e para os cabelos. Nesse assunto orgulho funciona como o melhor cosmético do mundo.

Fico incomodada também com a moderna enxurrada de debates sobre a frustração das mulheres. Todo dia vemos artigos, filmes, entrevistas, músicas, tudo sobre isso. Veja como são deprimentes os temas que a mídia espalha:


"Seis dicas para deixar de ser caso e se tornar namorada"
"Como manter seu homem"
"Como agarrar seu homem na cama"
" Ser bonita é essencial?"
"Você está só: e agora?"
"Existe vida depois da separação?" 
"Por quê ele foi embora?"
"Dez atitudes que afugentam os homens."

Isso tudo é pra lá de patético. E os homens só assistindo de camarote e morrendo de rir...


Não estou aqui para engrossar o coro das chorosas nem para defender a macharada.  Não entrarei no mérito da coisa. Só quero frisar que nariz empinado é o melhor cosmético que uma mulher pode adquirir. Não é barato, mas vale a pena.

"Apenas Mais Uma De Amor

Eu gosto tanto de você
Que até prefiro esconder
Deixo assim ficar
Sub-entendido

Como uma idéia que existe na cabeça
E não tem a menor pretensão de acontecer

Eu Acho isso tão bonito
de ser abstrato,baby!
A beleza é mesmo tão fugaz
É uma idéia que existe na cabeça
E não tem a menor pretensão de acontecer

Pode até parecer fraqueza
Pois que seja fraqueza então,
A alegria que me dá
Isso vai sem eu dizer

Se amanhã não for nada disso
Caberá só a mim esquecer
O que eu ganho e o que eu perco
Ninguém precisa saber."


Lulu Santos está certissimo. Orgulho na medida certa é extremamente charmoso.  Não dá é para sermos humilde com uma platéia comprovadamente carniceira.

Todas já cometemos o desatino de acabar falado algo que ninguém precisava saber. Só que aos 25, 35, 40 anos e daí por diante esses erros deixam de ser básicos para se tornarem grosseiros. Salto alto e nariz empinado é a nossa verdadeira vocação. Queridas, nascemos para a glória!

Não digo que devemos morrer sufocadas com uma confissão entalada na garganta. Não. Mas as amigas intimas estão aí pra isso mesmo: para nos aturar porque um dia elas também vão precisar da gente.

Viver não é fácil. Se um dia eu me encontrar nessa situação de fundo do poço da carência, já tenho pronta a oração de emergência:  "Senhor, me ajude a aguentar o tranco sem perder a pose! Amém".

15 de jul. de 2013

O que é romantismo?

Mesmo quando penso que sei a hora certa, não sei a hora certa. Até porque a minha hora é só minha e ninguém jamais saberá com exatidão nada sobre ela.  Já estraguei momentos que seriam maravilhosos só porque não os reconheci como "momentos certos". Achei que não eram - mas eram, justamente por isso!  Aqui a gente faz, aqui a gente paga: também já sofri pra caramba porque detectei um momento imperdível que a outra pessoa não viu, não deu a mínima.

Existe uma hora certa para ser romântico? 

Quando me imagino suada na cozinha, temperando um frango enquanto uma panela flameja, tenho dificuldade em acreditar que aquele momento seja propício a cupidos e corações. Ser subitamente abraçada e chamada a interromper tudo... Acho que eu não iria conseguir corresponder a contento.

Gosto de imaginar cenas românticas quando acabei de tomar banho e me vejo em silêncio, divagando, ouvindo música ou em um cenário bonito. Quando o vento bate fresco, quando caminho pela praia, quando tudo em mim parece apto e receptivo. Mas...  tudo isso me leva a pensar que o romantismo está justamente na cena deslocada, no momento errado e inesperado. O romantismo não seria a propria inconveniência feliz? Não estaria no arroubo, na capacidade de estar pronto para os arrulhos quando tudo parece contrário?   É aí que o amor é mais amor ou  pensar assim é puro romantismo?  

O que é ser romântico? É quando o relógio do coração está em descompasso com o relógio do mundo? Então não sou romântica porque prefiro que o momento seja propício? Ou sou extremamente romântica justamente por acreditar que existe nessa vida um tal "momento propício"?  Existem momentos perfeitos?   Romantismo é crer no que não existe...  ou crer no que poucos enxergam?

O que é romantismo?

7 de jul. de 2013

O sonho da Cinderela

Essa gravura é a cara da minha infância. Eu olhava coisas assim e passava horas sonhando. Era o que se pode chamar de "tirar o pé do chão".  Eu imaginava o baile,  a valsa, a beleza da Cinderela, o sufoco pra voltar pra casa, o lindo vesdido de cauda (suspiro profundo...) o príncipe apaixonado, a cinturinha fina, as mãos delicadas (apesar do trabalho doméstico - como?!) o castelo belíssimo, os cabelos sedosos, olhos brilhantes, a noite de gala inesquecível, o salão enoooorme cheio de luzes, cristais, o deslumbramento e eu - quer dizer ela, a Cinderela, sendo o centro das atenções... Oh, oh e mais oh!

Como são as coisas... Vejam vocês como o tempo passa e como tudo muda. Acreditem os senhores que hoje deparei com essa imagem e a primeira coisa que me veio à mente foi "caramba, que praga de castelo é esse que tem que subir tanta escada?"  Um autêntico pensamento de velha.

Cruz-credo.

3 de jul. de 2013

Janelas

Não preciso estar melancólica para afirmar que há algo de terrivelmente triste nas luzinhas amarelas que recheiam as janelas. E você há de concordar comigo, mesmo se estiver feliz.

Quando o hálito das casas escapa num início de noite e o cheiro da sopa ganha as calçadas à altura do nosso nariz, parece que nesse momento muita gente fica órfã.

Luzes amarelas são alegres por dentro mas tristes por fora.

Não é lamentável quando você caminha rapidamente fingindo ter pressa só para pensarem que você tem um mundo cálido lhe esperando em casa?  Talvez seja uma sorte quando pensam que  você "é uma daquelas pessoas egoístas que não precisam de família" .  Melhor o equívoco do que a pena.

Para muitos não há jantar pronto em  casa, a torneira da cozinha pinga, a porta range, há uma infiltração.

São tristes as janelinhas amarelas quando, do lado de fora, nossas botas estão molhadas, os pés estão frios, falta um botão no sobretudo e alguma coisa dói não sei onde. Logo-logo o homem apressado deixará a avenida principal e baterá o olhar nas pedras frias daquela casa da esquina.

Olhando de dentro para fora, a frieza do mundo é decorativa. Como nos cartões de Natal. Por mais que os personagens estejam no frio, todos se dirigem a um pequeno paraíso morno. É assim. Quando temos nosso cantinho é como se todos os outros fossem como nós. Essa ventura imaginário nos embala e o mundo parece um lugar aconchegante e justo. É nessa hora que nos concentramos na nossa felicidade e esquecemos os outros.

Como são distraídas as pessoas felizes!

28 de jun. de 2013

Sapatos fosforescentes


Uma das coisas curiosas que nos tornam bem interessantes é nossa capacidade de adotar teorias, sentimentos, impressões e fantasias totalmente contrárias entre si. Nós nos contradizemos tão frequente e descaradamente que na maioria das vezes nem nos incomodamos com isso. Poucos pensam a respeito de suas próprias incoerências.

Coerência é utopia?

Nunca esqueci de uma entrevista que li, certa vez, concedida por um escritor ateu. Ele era ateu até a medula mas confessava humildemente a inconsistência de suas emoções, pois tinha muito, muito medo de morrer e ir para o inferno.  Mas como? Não sei como, ele não sabia como, mas era assim. Não o critiquei. De certa forma achei bonito um homem tão inteligente fazer as pazes com sua própria natureza e confessar na boa que as coisas são como são. Somos estranhos, nem tudo faz sentido e talvez a vida fosse mais chata se tudo se encaixasse como Lego.

Nada mais tolo do que tentarmos limitar com teorias as nossas loucuras interiores.  Teorizar é aterrissar. Queremos aterrissar? Acho que não. Raramente.

Sou uma fábrica de teorias. Eu mesmo as faço, conservo e as tenho para todas as ocasiões.  Se precisar pode vir falar comigo. Mas também existe aquela portinha... Sabe aquela portinha discreta no canto do quarto? Ela leva a um compartimento discreto onde armazeno todas as minhas produções mais  autênticas, esquisitas e sem sentido. Sim, tenho minha cota a confessar de sensações que não se encaixam. Um exemplo: a despeito de tudo o que creio a respeito da vida, da morte, da alma e-tal-e-tal, o meu tolo pensamento é:  Onde será que ficam guardadinhos os bebês que não puderam nascer???? Onde estão armazenados? Como se sentem? Pobrezinhos!   Aí visualizo uma espécie de berçário celestial com criancinhas roliças e sorridentes, outras meio carentes, todas ansiosas para conhecer papai e mamãe. Todas certas de que serão amadas, de que não serão abortadas, de que a vez delas vai chegar e que vão ser muito felizes. E sinto um dó de saber que muitos não vão ter chance. Eu hein!

Não faz sentindo. É como ter um sapato fosforescente verde e roxo que não combina com nada do meu guarda roupas.

Eu sei que você também tem seu par de sapatos fosforescentes escondidos no armário.

Conheço gente inteligente, esclarecida, adulta, mas que tem medo de escuro. Mesmo sabendo que tudo que há no escuro é a exata repetição do que vemos no claro. Não há mistério nem monstros nem surpresas à espreita. Essas pessoas podem escrever um livro sobre isso, podem discursar sobre essa tolice. Podem até convencer alguém!  Elas não estarão mentindo, não estarão fingindo! Claro que acreditam no que dizem! Mas tem medo do escuro.

E dando continuidade ao fato, a pergunta que se segue é: seriam as minhas impressões os tentáculos da verdade que, perdendo a paciência, tenta entrar à força na minha cabeça? Serão elas a verdade verdadeira se insurgindo contra minhas teorias esfarrapadas, querendo se impor no grito?

São tolas as teorias ou são tolas as impressões?

Existe uma verdade que quer vir à tona mas nossa mente de amendoim não permite? Há uma revelação querendo se esparramar na Terra mas sendo capturada antes disso por uma rede de teorias furadas? (Já que toda rede é furada!) Ou este é só mais um daqueles pensamentos tolos que deveriam estar no quartinho?

E aqui termino a exposição da minha inquietação de hoje.

23 de jun. de 2013

Mitos *


Um grande erro é confundir mito com mentira.  É até compreensível, já que as palavras são parecidas, só que o que expressam é o inverso, uma da outra.

A mentira não está ligada a nenhum fato.  Ela se inspira em fatos, mas não é parida por eles. A mentira é uma pluma artificial flutuando por aí, saída de ave nenhuma. O mito não.

O mito tem a mesma origem grave das profecias, dos enigmas, dos hieroglifos. Estão nos dizendo algo, mas como a gente não entende, acaba preferindo acreditar que são desenhos decorativos.

Os mitos não são desenhos decorativos em nossas cavernas. Eles são verdades registradas de modo peculiar, estranhos para nós. Eles são o que sobrou de um tempo perdido no passado. Emanam de verdades que não conhecemos, que foram soterradas. Os mitos são verdades capengas. São máquinas faltando  peças. São a carroceria de um caminhão que, como não pode mais circular só serve agora para divertir as crianças. Crianças adoram brincar em carcaças de carros. Por isso adotamos mitos. E também por isso não os levamos a sério.

A magia é parecida com o que expliquei. Claro que existe! Magias são fatos que a gente não tem como explicar. Parecem caçoar da ciência. Só que nada caçoa da ciência!  Magias são acontecimentos incontestáveis e inexplicáveis, em relação aos quais nos sentimos mais seguros se desacreditarmos.
Toda magia, quando explicada, muda de nome.

Magia explicada se chama CIÊNCIA.

21 de jun. de 2013

Nada sabem os que nada sabem


Ainda  não entendi por que é que toda vez que alguém recita a famosa frase "Só sei que nada sei" a pessoa o faz com displicência, sorrindo, como se estivesse fechando com chave de ouro alguma discussão que andava em círculos. Como se com isso tomasse as rédeas da razão e não pudesse mais ser questionado. Pois eu o questiono.

Poucas coisas são tão dolorosas do que o achincalhe das nossas certezas. "É assim que se evolui" - concordo! Mas machuca! Não dá para rir. Eu não consigo. Toda vez que concluo que "nada sei" eu o faço com a resignação de quem se auto flagela.

A menos que o sujeito nunca tenha sido afeiçoado ao ato de pensar e não passe de um "retuitador" cego, ele vai sofrer a dor do crescimento.

Não admiro gente rala.  É muito fácil pisar no que os outros construíram e sorrir dos desmoronamentos mas experimente construir seu próprio castelo, conclusão por conclusão, e depois descobrir que nada daquilo merece um alvará.

Descobrir que seu saquinho de certezas sempre esteve furado é duro. Constatar que as decisões tomadas eram, muitas das vezes, amparadas por pressupostos podres e se alguma coisa deu certo você já está no lucro...

Quem proclama "nada sei" sem a gravidade que a frase merece, é um bobão. Deveria pelo menos levar uma cachuleta pra acordar pra vida. A postura que se espera depois da constatação é a testa franzida e uns segundinhos de silêncio logo após a grave proclamação.

Somos assim: temos a mania de aguar tudo. Qualquer grande verdade só continua sendo grande enquanto é contestada. Nesse ponto o pessoal "do contra" presta relevante serviço à vida.  Porque depois que um conceito é totalmente aceito  a macacada o repete sem parar com aquela boca mole até que ele desbote e perca o vinco.

Algumas frases deveriam permanecer guardadas dentro de um recipiente de vidro e, ao lado, um martelinho e uma placa: "só quebre em situações relevantes.". Só assim para levarmos as coisas mais à sério.

Ah você quer uns exemplos de frases que deveriam ficar no vidro? "Mãe só tem uma", "Tudo passa", "Só sei que nada sei", "A vida é curta"...  E por aí vai. Se você tiver mais algumas sugestões, pode dizer nos comentários mas não esqueça: cenho franzido e ar grave, porque aqui é tudo muito sério.






14 de jun. de 2013

Adoro aeronaves espaciais! *

Quem não ama aeronaves? São o ambiente perfeito para viver! 

Obviamente não estou falando naquela capsula de tortura chamada de "avião". Refiro-me à imensidão asséptica dos filmes espaciais. 

Prefiro, obviamente, sol e jardins, mas isso está cada vez mais difícil de conseguir. A vida real está mais pra high tech do que pra  para Jardins Suspensos da Babilônia.  

Pra começar:  aeronaves estão sempre limpas. Poeira zero! Nada dessa coisa desprezível de encontrar palitos pelo chão, "arte popular" (pixação) copinhos de café ou camisinhas usadas. Cestos de roupa suja? Jamais! Também não esbarramos nunca com faxineiras arrastando baldinho ou vendendo Avon. 


Material: o que não é feito de liga metálica ultra resistente  é de aço inox esterilizado. O resto é blindex ou silicone. Tudo térmico, claro.

As pessoas são limpíssimas. O suor e a caspa foram abolidos pelo comandante e todo mundo acatou. 

Melhor do que as aeronaves são o cruzamento delas com as estações espaciais. Uma cidade flutuante onde é sempre dia do lado de dentro e sempre noite do lado de fora!

Não há impressões digitais nas aeronaves. Isso por dois motivos: porque ninguém anda por lá com as mãos engorduradas e porque não há crimes. Sem crimes, pra quê digitais? 

E todos são magros. Envelhecem mas não perdem a pose. Alimentam-se com uns quadradinhos sintéticos que não sei o nome mas tem o gosto que a gente quiser, dependendo do que escolhermos nas maquininhas de auto sugestão. 

Outra coisa maravilhosa: ninguém se perde. Nem de olhos vendados. Para alguém como eu, que ainda não desvendou nem a garagem do shopping, isso é um sonho! Pois a planta de uma aeronave espacial é perfeitamente memorizável. Todas tem escadas que dão para imensos túneis ao longo dos quais você verá luzes piscando e vaporzinhos azuis. Siga o vapor verde até encontrar a esteira rolante. Escolha um elevador transparente - evite os que não são transparentes para não acabar trancado em uma geladeira. Se der tranco não é elevador, é  máquina de teletransporte - cuidado!  Se escapar disso você será recepcionado por uma voz calma e amistosa. Ignore-a. Siga as setas virtuais até a arena. Entre na porta tipo pálpebra. Depois de alguns corredores-tubo você verá entradinhas que levam às encubadoras. Não bisbilhote. Siga e visite a salas de controle. De lá rapidinho você chega ao salão das escotilhas. Novas esteiras rolantes aparecem e te levam certinho até a escada caracol que leva à sala das máquinas. É lá que rodam as cenas de perseguição. Pegue a passarela ou a ponte que dá para o hall da fama, depois ao salão das Criaturas e ao salão das mini capsulas. Se quiser alguma informação entre na sala cerebral. Cuidado com o scanner  de auras. Só depois dele você chega à ala das baianas - digo - dos dormitórios herméticos, para então...  Ah, você já entendeu. 

Na correria dos filmes todo mundo sempre sabe onde está indo, ninguém se perde. Fico encantada! Talvez já exista algum tipo de Google Maps pra implantar no cérebro. Como não pensei nisso antes?

Ah: e todas as cadeiras tem rodinhas - exceto as flutuantes. 

E as roupas?  Imagine um traje que não suja, que não estraga, não desbota, não perde o vinco e não enjoa.  São confeccionados com  uma mistura de fibras de seda, silicone, metal elástico e garrafas pet recicladas. 

E tem mais! Todos os tripulantes estão plenamente habilitados a operar ou reparar uma aeronave espacial. Do mais novo ao mais velho, todo mundo é mecânico e engenheiro eletroeletrônico aeroespacial. Problemas com a energia? Todos sabem onde parafusar, qual fio cortar, qual peça trocar e a sequência correta que as luzinhas piscam. Pouco oxigênio? No problem!  Em caso de pane qualquer mané sai correndo pelos corredores e puxa a alavanca certa e ainda checa as turbinas, de quebra. O GPS pirou? Não esquenta: pegue o estagiário da ala W que ele pode digitar de primeira a sequência de numero-código que coloca tudo em ordem. Se ele não estiver no casulo pode chamar a mãe dele que dá no mesmo.

Tá de saco cheio? Tranque-se em uma capsula de hibernação e acorde só quando a raiva passar. Morreu? Congele-se até encontrarem a cura. 

Sim, eu quero morar nesses lugares onde qualquer um nasce sabendo, não existe salto agulha nem tecno brega.

Olho para o céu e suspiro... O que é que eu tô fazendo aqui?  Em algum lugar do espaço existem pessoas com porte vitalício de armas a laser. Em algum lugar do espaço existem pessoas que dominam a tecnologia, tem seus próprios micro apês e entendem o dialeto dos físicos. E tudo o que precisam fazer para ganhar a vida é apertar os botõezinhos dos painéis. Podem olhar os planetas de perto, não precisam ir a chás de panela nem pegar autorização pra fazer exames. Não são importunados por ácaros, os eletrônicos não usam fios e os celulares tem bateria inesgotável.

Em algum lugar do universo... E eu aqui, descascando batatas no porão...

12 de jun. de 2013

Nosso oráculo


Não há muito o que escrever sobre o Dia dos Namorados e estou desconfiada de que não há muito a dizer sobre praticamente mais nada nessa vida.

Sei lá, hoje é assim. Amanhã poderei estar jorrando verbo.

Às vezes paira um tédio no ar. Você não sente?  Nada de mais. O tédio faz parte da natureza de todas as coisas. É como nossa sombra: não se assuste ou se irrite com ela.

Não me refiro ao tédio bobinho, essa coisa de querer fazer um negócio legal e indefinido e ficar com raiva porque não se sabe o que é essa coisa  legal,  muito menos como fazer o indefinido. O tédio de que falo é o tédio filosófico, da monotonia dos saberes. Se não é isso, é quase isso. Bem, esse tédio pode ser  tão real mas tão real que estou sentindo agora aquela desconfiança de que já falei sobre isso antes, só que estou com preguiça de constatar.

Pra quê constatar alguma coisa? Nada mudará de lugar: estará lá se você quiser voltar depois. Tomara que você tenha mais o que fazer.

Tédio ... de ver as mesmas questões sendo apresentadas como se fossem novidade mas sem o ser. Como se alguém enganasse a platéia lançando como primeira edição um livro que já está na quadragésima.  Tédio de saber que é assim mesmo, que sempre haverá uma maioria se assombrando com "surpresas anunciadas" e que essa maioria é útil.. Tédio de ver tudo se repetir na história da humanidade, de saber para qual buraco estamos indo, de saber que não adianta saber e não adianta não saber e não adianta saber o que é melhor dentre essas duas opções. Tédio em ver que a resposta para tudo existe.

Nosso oráculo é o passado.

Está escrito: "tudo o que é, já foi, e o que há de ser também já foi, de maneira que não existe novidade alguma debaixo do sol."

A vida é uma refilmagem. Já rodaram isso zilhões de vezes mas sempre aparece uma multidão que não assistiu. E quando aparece um que assistiu e conta o final, ninguém acredita.

Nosso futuro está registrado no passado de mil modos. Às vezes em hieróglifos, línguas mortas, escrita cuneiforme, francês, dialetos estranhos, histórias em quadrinho. Está tudo lá, nas cavernas, nos mistérios dos livros de história, nas cenas vividas por gente estranhamente vestida. Não jogue fora os jornais velhos!.

Está tudo na lembrança dos nossos tataravós. A verdade vem das bochechas moles das velhinhas, escorrem das suas gengivas que não queremos fitar.  Os astros nada sabem. Para onde os ponteiros do relógio estão indo? Para o mesmo lugar de onde vieram.

Olhar para trás pode ser assustador porque podemos dar de cara com nossa própria  figura em atitude suspeita. Há alguém no passado a me denunciar:  eu mesma! com as mesmas ideias e manias, as mesmas cismas e covardias. Nossa figurinha é bem conhecida.

As pessoas maquiam a história porque tem medo de serem reconhecidas. Existem várias cópias nossas espalhadas pelo passado e ninguém quer ser flagrado frequentando certos episódios. Documentos históricos podem ser terríveis como o espelho da madrasta da Branca de Neve. Por isso adulteram os livros, exatamente por isso. E é isso que faz com que falem tanto no futuro: porque  distrai a platéia já que olhando pra frente a gente não enxerga nada mesmo.

Pelo nosso caminho há espelhos espalhados e eles nos remetem ao passado. Tudo o que podemos fazer - e de fato estamos fazendo - é virar rapidamente o rosto e seguirmos em frente. Às vezes adianta, às vezes não.

REALIDADES BRASILEIRAS