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13 de mai. de 2016

O nosso Al Capone

O NOSSO AL CAPONE:

Lembram do famoso mafioso Al Capone?  Ele cometeu muitos e muitos crimes.  Era algo sabido e notório, o que o tornava um homem poderoso e temido . Seus crimes, entanto ,  eram de difícil comprovação. 

Bem, Al Capone tinha que ser detido de qualquer forma. A mafia estava contaminando tudo, estava matando muita gente e desafiando as leis. Cada dia Al Capone se tornava mais violento, temido e poderoso. O único jeito encontrado para dete-lo foi processa-lo por sonegação de imposto.

De fato "sonegacao" parecia ser um crime de pequena gravidade se comparado aos demais. Mas foi esse crime que o tirou de circulação.

Exatamente assim ocorreu com a Dilma. Estava destruindo a economia nacional inclusive através de doações ("empréstimos amigaveis") a outros países. Sustentava a milícia armada terrorista chamada MST  , "importou" falsos médicos para exercer ilegalmente a medicina no país ...  Utilizou ilegalmente dinheiro do fundo de pensao dos correios,  prejudicando terrivelmente centenas de funcionarios....  etc. Mas até tudo isso ser completamente esclarecido ela já teria terminado o mandato e arrasado mais ainda nossa economia. O jeito de parar sua assombrosa incompetência foi acusando-a de  cometidento de crime de responsabilidade.

Ela de fato o cometeu mas para muitos tal crime é brando demais e deveria ser deixado de lado. Só que foi justamente esse ilícito que nos garantiu seu afastamento. Foi o mais documentado e rápido  de provar. 

A Dilma é o nosso Al Capone, preso pela "besteirinha " de sonegar imposto.

11 de mai. de 2016

Regra do tempo

A época em que eu mais escrevi foi justamente na que menos tive tempo. Tantos afazeres, tanto o que escrever. Então eu lamentava que a vida não se deixasse observar, que fosse tão apressada e cheia de exigências. Eu sonhava com o dia em que poderia dispor do tempo que fosse necessário para fazer tudo aquilo que eu achasse necessário. Como se se tratasse de uma prateleira, eu sonhava em pegar mais algumas latinhas de tempo, encher meu carrinho e sair toda faceira para dar um jeito no meu meu universo.

Houve uma época em que eu me levantava antes do sol , para correr. E corria. Cheguei a conhecer cada buraco das calçadas, cada cachorro das redondezas. As casas bonitas, as casas descascadas, as casas abafadas.  Algumas casas bocejavam em mim. Eu sentia o bafo quando passava rente nos meus trotezinhos de pseudo atleta.  Portas entreabertas. cheiro de café, roupa amarfanhada, xixi de gato. Algumas casas acordavam cedo, outras abriam os olhos só no meu retorno. Nenhuma me saudava, mas me olhavam, me reconheciam. Sabiam quem eu era.

Acho que as casas mais felizes tinham vovós ou eram de recém casados. As casas mais tristes não tinham crianças, só adultos enjoados, metidos em subempregos.

Houve um tempo em que fiz o contrário: chutava as atividades físicas para a noite, depois do trabalho.  Largava a seriedade da vida e incorporava shortinho e top. Aí se resumia toda a minha rebeldia.   Ah: e eu não me apressava em voltar pra casa. Foi uma época triste. Não era pra ser porque eu gostava da academia a noite.  Nunca mais estive tão em forma. Magra, sem celulite, toda durinha. Saudade.  A alma estava um caos  mas ninguém nem notava.

 Na hora do almoço eu ia ao shopping, as vezes ao supermercado,  ao cartório, à oficina,  médico , salão, laboratório. Eu era eficiente e não sabia.  Devia me sentir orgulhosa mas ao invés disso preferi apontar meu olhar para um futuro glorioso no qual eu faria tudo isso e muito mais, e com as unhas impecáveis.

Bobagem.

Há algum tipo de feitiço no tempo. Só conseguimos fazer tudo quando não temos tempo. O universo ajuda os ocupados.  Mas quando temos tempo, ele nunca é suficiente.  O universo se ressente contra as pessoas mais livres. Isso não tem lógica mas é assim que as coisas são.

Deve haver alguma lição cósmica nesse assunto, alguma coisa que... não consegui agarrar.   Intuo um ensinamento flutuante a rondar por aí como uma pena ao vento. Por que não tenho tempo agora, que o tenho? E por que eu o tinha quando mal conseguia tocá-lo?

Estou há semanas sem ir à academia. Nunca mais escrevi aqui no blog. Inclusive nesse momento não estou escrevendo, como você pode notar. Não visitei minhas amigas, não aderi a um trabalho voluntário. Estou cansada, os dias estão mais curtos. Perdi as rédeas.

Minha vida mudou radicalmente de uns poucos anos para cá. Cheguei dessa viagem de mudança e ainda não consegui organizar as roupas das malas. Isso me incomoda. E como tudo está bagunçado, receio um dia acordar e descobrir que os dias resolveram passar de três em três...  e quanto a gente se distrai demais ele se irrita e resolve dar uns saltos de uma semana.

É ruim andar de olhos fechados no corredor imaginando que tenha grande extensão e, de repente, dar de cara com a porta de saída.

9 de mai. de 2016

O que é ser "Emo"



Hoje estou emotiva e com vontade de abrir o coração. Sente aí e me ouça.

Sempre pensei assim: que temos que viver plenamente todas as fases da nossa vida. Se uma delas nos for surrupiada nosso espírito nunca descansará em paz - e não me refiro a nada pós morte. 

Você não tem nenhum amigo meio velhote mas que não se convence disso? Está enrugado mas jura que é garotão, os programas são de garotão, conversa como garotão, raciocina como garotão... Na verdade você nem aguenta o cara. Por que ele é assim? Porque provavelmente não teve adolescência. Isso acontece também com mulheres que supostamente teriam o "espírito jovem".

Espírito jovem nada mais é do que mentalidade que não evoluiu, não passou para a próxima fase do vídeo game e fica repetindo o jogo para sempre. Acho meio patético. Não quero ficar assim. 

Isto posto, continuo: sabe, praticamente não tive adolescência. Claro que você não quer ouvir o lero-lero que me leva a dizer isso. Vamos pular essa. O fato é que minha infância foi beleza mas  por muito tempo da minha vida adulta eu quis viver mais um pouco da minha adolescência, pelo menos por uns meses. Eu achava que só assim eu entraria com a cabeça erguida (sem micos) da maturidade. 

Uma das coisas mais adolescentonas que conheço é ter uma turma, uma galera, uma tribo. Cara, uma tribo, era isso o que me faltava! Quem sabe se eu me adequasse a um grupo poderia viver uns lances maneiros, não é?  Pensei muito tempo sobre isso. Como sou "um pouquinho" indecisa, estou pensando até agora. Não posso precipitar uma decisão assim tão importante. É da minha adolescência que estamos tratando!!!! Pesquisas seriam necessárias.

Um dia...  Li no blog de uma adolescente (Cristiane Reis) a explicação de o que seria ser um Emo (ou, no meu caso, uma Ema????).

Sempre me identifiquei muito com os hippies... mas eu era jovem demais na época do auge do movimento. Lamentável...  É como dizia o Veríssimo: "Nasci na época errada. Eu era jovem demais para ser hippie, agora sou velho demais para ser punk..."   Ele escreveu isso a pelo menos uns 15 anos e tem a ver comigo.

Lendo o texto que colarei abaixo adianto mais uma desilusão: eu bem que gostava dos punks mas... minha alma sempre foi mais leve do que aquilo. Algo me dizia que haveria de surgir uma "tribinho" mais amena para mim. Surgiu mas... será que também tô fora?  Veja e analise o texto de Cristiane Reis. Os comentários entre parêntesis e em negrito são meus.

"O que é ser Emo?Emo é o jovem  (ihhh! Dancei!) que alia som pesado à sexualidade flexível.  Faz parte de uma nova tribo que está surgindo em substituição às patricinhas (que os homens não admitem mas adoram), aos góticos (eu gosto) e neo-hippies. O que distingue o emo não é só a música, e sim as atitudes. O nome vem de emotional hardcore (???), vertente do punk que mistura som pesado com letras românticas (ah tá). Ele têm entre 11 e 18 anos e, nas roupas, é capaz de misturar as botas do punk, o colar de Wilma, a mulher de Fred Flintstone, e uma camiseta com a gatinha Hello Kitty (ih!). Não esconde os sentimentos, expressa abertamente suas emoções  (tô dentro), preconiza e pratica a tolerância sexual (não "na minha"). Gosta de música emocore (cumé?). O estilo mescla a batida hardcore com letras românticas e poesias adolescentes. Vive na internet e no Orkut  (...ou Face). É emotivo. Chora ouvindo músicas que falam de amores perdidos e rejeição dos pais (essa parte é fácil também). Dá demonstração explícito de carinho (sou fraca nesse quesito). Se beija e se abraça em público (hhmm), seja com pessoas do sexo oposto, seja com as do mesmo sexo. Aceita a opção sexual do outro sem preconceitos. Escreve diários, poesias e músicas. Seja ele menino ou menina. Usa roupas que mescam a rebeldia punk com os ícones infantis. Menino ou menina usa rosa . Usa cabelos lisos com enormes franjas no rosto. Usadas somente de um lado, denotam certa ambigüidade sexual. Não curte drogas (será?). Luta por um mundo sem violência, em que um dia todos se abracem sem parar (que meigo!)

É, não deu pra mim. Vou esperar a próxima moda.



1 de mai. de 2016

Madrugada

Madrugada. Pedi a noção da hora.  Nem sono nem disposição. Apenas existo em um estado de alerta meditativo. Existo como uma antena pronta para todo tipo de recepção. Quero perceber coisas da noite.

Talvez o único grande mistério da noite seja a sua capacidade de subjugar todas as pessoas. A noite impõe sossego como um pai mandando as crianças para a cama. É simplesmente mágico que todos obedeçam.  

Por algum motivo a madrugada me remete à ideia de eternidade. Acho que eternidade é quando o tempo não se faz sentir. É quando ele, consciente da sua inutilidade, retira-se de cena na ponta dos pés e ninguém sente a sua falta. Então o tempo passa a ser apenas um fantasma no qual ninguém mais acredita.

Tédio pressupõe passagem do tempo. Não há tédio onde não há tempo.

Madrugada. Gosto de me sentir senhora de mim. Ninguém me observa ou impõe comportamentos. Dessa liberdade imagino coisas.

Madrugada. Penso nesses milhões de pessoas dormindo como se fossem bebês barulhentos que, finalmente, entregaram os pontos. Bebês difíceis, trabalhosos. Agora estão calmos, dormindo consolados das agonias do dia. Talvez seja essa a melhor parte do dia: quando grande parte do mundo se torna um imenso berçário.

Todas as pessoas são boas enquanto dormem. Seus piores pesadelos não afetam o mundo exterior. São inofensivas e desprotegidas, o que me desperta uma quase ternura. Quando os vejo assim, rendidos, perdoo-os todos.  Todos tem salvação. Tem sim. Se Deus quer salvar a humanidade deve colher nossas almas durante a noite,  enquanto dormimos.

Por um instante me comprazo em imaginar que seria viável acreditar que todas  as pessoas são reprogramáveis para o bem.  Ou que pelo menos todas são suscetíveis de serem contaminadas por um tipo raro de bactéria que as levasse a um comportamento diferente.

Numa manhã qualquer, assim do nada, as pessoas acordariam esquecidas das coisas de gente grande. A inocência do sono se expandiria, invadindo também as horas de vigília.  Então todos acordariam com um outro coração, uma outra disposição para com o próximo. Esqueceriam das porfias, dos rancores, vaidades e inquietações. Acordariam leves e descansadas como se tivessem hibernado meses.  E iam querer tão somente aproveitar o sol , ir pra rua de chinelos, espreitar borboletas e fazer amizades. Todos se deslumbrariam com os pequenos insetos, com os pássaros assustados das metrópoles e folhas empoeiradas que se desprendem das árvores.  Puxariam conversa com o mendigo, com o vizinho e o moleque da esquina e dariam toda a atenção do mundo ao que eles respondessem. Esqueceriam de cobrar as dívidas e também de pagá-las.

Com tantas doenças surgindo, de repente me parece razoável que algo novo e muito contagioso esteja sendo gestado em algum lugar. E essa coisa contaminaria as pessoas para o bem. Por que não? Isso aconteceria obviamente durante a noite, no rastro da madrugada, quando ninguém se defende de nada.

Quem sabe ... quando a gente menos imaginar pode acontecer uma contaminação de grandes proporções , que  leve as pessoas de volta à humanidade inicial. Voltaríamos a ser o que nunca deveríamos ter deixado de ser. Perderíamos totalmente o apetite para o poder ou ostentação.  Todos acordaríamos cheios de perdão e simplicidade. Talvez não um perdão consciente, nascido de um esforço bem intencionado. Falo do perdão verdadeiro, aquele que acontece sem a gente se dar conta;
aquele que brota sem ser chamado só porque o terreno do coração é bom. Refiro-se ao perdão das crianças: o perdão do esquecimento.

Um dia... quem sabe... todos acordaremos irreconhecíveis e nos sentiremos muito bem com isso. Esqueceremos o que já passou e flores rebentarão do asfalto.



27 de abr. de 2016

Azul



Entrei esses dias em um palacete antigo onde sempre tive vontade de entrar. Não tive acesso a todos os cômodos mas entrei. Passei por um portão de grades trabalhadas, azulejos desgastados por milhares de chuvas, saltos e pontas de guarda-chuvas.  Mas apesar de tantos rastros tão mais sólidos do passado, nada me comoveu mais do que aquele azul.

Tudo me comove em construções antigas, de forma que já estou acostumada a ser tocada por maçanetas de louça, vidraças jateadas, tábuas corridas, coisas simples, curiosas, comuns ou graciosas da arquitetura do passado. Adoro principalmente  quando as paredes levantam as saias e me deixam ver pedras desiguais e o barro que as une. Mas agora foi a primeira fez que o que me fisgou foi a cor.

Ah o azul celeste descaradamente romântico, delicado e fora de moda! Sabe o azul celeste que, quando muito, vemos em quarto de bebê? Pois ali estava ele, naquelas paredes enormes, recostado no branquinho de portas e janelas.  Tão fora de uso que se olhássemos só pra cima só veríamos o passado - e aí que estava a mágica. Fixei meus olhos do meio da parede pra cima, pra não pegar pedaço de móvel nem de cabeça de ninguém.  Funcionou. Tive então uma sensação de paz, uma coisa tocante,  desejo saudoso de sentar ali, de vestido comprido e rendado, sabendo que não haveria carros lá fora. Era como se alguém me pegasse pelo braço e me mostrasse exatamente o que está me faltando e de onde vem minha melancolia.   Então vieram ondas suaves de memórias não ocorridas, lembranças não vividas e imagens de pessoas não nascidas. Vi a rua de pedras, o vendedor de cocada passando com sua camisa branca e puída, sem sapatos. Vi a mim mesma sentada enquanto uma menina brincava no chão com seu vestidinho de algodão. Por algum motivo todas as roupas eram claras, inclusive a da serviçal que ali estava, tranquila, sem pressa, nos fazendo companhia como boa amiga. Havia também uma máquina de costura perto da janela e eu sabia que outras pessoas transitavam na sala e na cozinha, atrás de mim, E todos me respeitava, e eu era velha e feliz,  Os poucos ruídos eram domésticos e denunciavam cada morador daquele palacete. Da rua só vinha o silêncio e o sol brilhante e a certeza de que a qualquer momento alguém querido iria chegar. Uma comoção calma vinda daquela parede azul, um sussurrar de um passado distante e desconhecido que no entanto não deveria se perder porque fazia parte de mim, de todos nós. O que sabemos de nossas tataravós?

Como era tudo tão diferente das cores vibrantes nas quais ando envolvida! Por que a gente muda tanto? Então eu quis o azul pra mim, quis muito! Quis ele e tudo o que ele conseguia fazer comigo. Desejei mais do azul como quem deseja mais uma fatia de bolo, mais um biscoito de manteira, mais uma bolinha de polvilho, numa espécie de gula da alma.

Lembrei do almoço e do lanche que viria com aquela tarde calma. Senti uma paz tão grande com aquele cor que eu não queria mais olhar para baixo e me deparar com a mesa, a moça, o computador, os arquivos e tudo o mais que afugentaria aquela mágica.  Aquele azul não combinava com nada que estava naquela sala.  Quem decidiu que aquela cor deveria permanecer ao longo dos anos? Isso só pode ter sido imposto por algum espírito antigo. Alguém do passado impôs de alguma forma, usou algum modo misterioso de influência para que isso servisse  como sinal de que ali já morou uma família distina , que aqueles ambientes aconchegavam suavemente gerações contemporâneas, que havia paz na janela aberta e música na máquina de costura. Ali estava todo o meu passado absurdo e não vivido.

Saí del lá com umas figuras de Versalles grudadas na parede da memória. Tudo por causa de uma bendita parede azul.

23 de abr. de 2016

"Gaviotas"


Ah, as gaviotas...

Não me corrija! As crianças é que sabem dar nomes corretos às coisas. Quando uma criança diz que é, é porque é.

As palavras segundo as crianças encaixam melhor em nossas bocas assim como uma dentadura feita sob medida. Corrigi-las é como forçar uma pessoa a usar a dentadura do colega de trabalho. Com o tempo a gente pode acostumar, mas não deixa de ser anti natural.

Sempre achei que as "gaviotas" voavam melhor que as gaivotas. As gaivotas voam meio torto, pesado. Como é lindo ver uma criança enchendo a boca e apontando com o dedinho "olha pai! Uma gaviota!" Nem se compara com "olha filho, uma gaivota!"

O mesmo eu digo das "salchichas": muito mais saborosas e suculentas do que as industrializadas e maléficas salsichas, cheias de corante.

E as "táubas"? Que barato! A gente podia fazer mil brincadeiras com elas! Inventar prancha, "esqueite", tudo! Já as tábuas não, são um perigo! Cheias de farpa, prego enferrujado sempre à espreita... Mantenham seus filhos longe das tábuas!

E na minha opinião todos os "poblemas" são contornáveis. Feliz de quem tem poblema. As crianças sabem disso no fundo de seus coraçõeszinhos inocentes. Por que corrigir-lhes e encher-lhes as mentes de pessimismo? Um adulto com "poblema" é um adulto otimista, não um ignorante. Enquanto ele tiver "poblemas" estará a salvo. O proplema não são os "poblemas" mas os problemas, entende?

E aqui vai uma dica: nunca dê refrigerante aos seus filhos. Faz mal. Mas "fizelante" está totalmente liberado e ainda desce redondo. A molecada sabe.

19 de abr. de 2016

Papel-papel

Lendo um romance, esses dias, deparei-me com uma cena simples, comum, na qual alguém mencionava o uso de "papel almaço".  Foi quando lembrei que esse é mais um item simples e querido do meu passado.


Antigamente, nos dias de prova, cada aluno tinha antes que passar na papelaria e comprar uma - ou duas folhas, por precaução -  se quisesse fazer a prova. Se não levasse o seu papel, o aluno estava frito.

Qualquer papelaria decente tinha papel almaço.  

Outro item tambem sumido do meu cenário de criança é o papel carbono. Ah o papel carbono! Como eu gostava dele!  Era o que havia de mais pratico para copiar desenhos e fazer trabalhos escolares. Como trazer para o caderno um mapa do Brasil? Com papel carbono, ora bolas!  E como copiar desenhos para colorir? Datilografar trabalhos, contratos, recibos, notas fiscais, tudo em três vias? com papel carbono. E os moldes para bordados?Também. Era o salva-vidas das pessoas laboriosas. Qualquer escritoriozinho de ruela esburacada tinha que ter. Poderia faltar papel higiênico, mas jamais o carbono.  Qualquer mãe que prezasse o sucesso escolar dos seus filhos tinha também, guardadas em alguma gaveta várias folhas novinhas.

Sei que parece bobagem mas dá uma saudadezinha dessas pequenas coisas que habitavam meu dia-a-dia. Se esses itens não sairam de circulação, pelo menos do vocabulário das crianças saíram. E eu, que não imaginava como alguém poderia se virar no mundo sem eles, vejo que todos seguimos em frente e estamos muito bem, obrigada.

Ah as papelarias de antigamente... Graças a Deus as cartolinas ainda existem! Mas se quisermos decorar cartazes com decalque, ficaremos na mão. Eu adorava comprar decalques. Pedia para a moça do balcão e ela trazia da prateleira uma caixa de papelão cheia de decalques com as mais variadas figuras para ilustrar trabalhos, decorar cartas, cartazes ou sei lá mais o quê. Eu ficava um tempão escolhendo. Queria todos! Na dúvida, os ramos de flores sempre venciam.

Se você não sabe, os decalques eram os ancestrais do clipart.  O Control C + Control V da época era assim:  a gente mergulhava a figura num píres com água. Deixava mais ou menos um minuto e quando ela estava desgrudando do papel, pegávamos com cuidado e fazíamos com que escorregasse para o local onde ficaria para sempre. Depois era só pegar um paninho bem macio para secá-la e pronto! Uma maravilha.

Acho que chega uma época da vida em que reviver se torna mais divertido do que viver. Nesse ponto torna-se quase irresistível tentar seqüestrar o interesse de quem estiver por perto para o nosso baú de lembranças.  Não adianta muito.   É que não queremos sentir nada sozinhos. Quem bebe, quer beber acompanhado. Quem come também. Cinema bom é com alguém do lado, para discutir (ou explicar) o filme. Pois também queremos companhia para as nossas saudades. Nada mais compreensível!  Mas geralmente o que a gente consegue, se tiver sorte, é um ouvinte educado (educado por fora e inquieto por dentro).

A vida, às vezes, é cruel.

Junto com o papel almaço,o carbono e os simpáticos decalques, lembrei da minha pasta escolar, que era de couro!  Não, na época ainda não era chique. Você vai rir mas vou contar: lembro bem do surgimento das revolucionarias mochilas. No começo achei meio estranho andar com uma pasta nas costas.

Pra terminar: minha camisa do uniforme era de algodão puro. Na época isso também não era chique. Chique foi o que vi uma colega usando: uma leve e "inamassável" camisa de poliéster!   Bem que eu havia reparado que a menina estava sempre impecável e sua roupa não amassava nunca!  E eu, mesmo tomando todo o cuidado, amarfanhava. Foi quando descobri que o truque eram os uniformes de poliéster, que não amassavam! Ô inveja!

Como as coisas mudam...

Os adultos diziam, quando eu era menina, que sentiam saudades de um certo "papel mata-borrão". E eu perguntava pra que raios poderia servir aquilo. Alguém me explicou que eles eram necessários porque as canetas não eram esferográficas. As canetas-tinteiro, ou as penas, às vezes encharcavam com a tinta do potinho, entende? Então pra não borrar o trabalho usava-se o papel mata-borrão, que na minha opinião seria melhor denominado como "papel chupa-chupa".

Está chegando a época em que ninguém mais vai ser tão específico quanto aos papéis. "Mata-borrão, almaço, carbono, papel quarenta quilos, nada disso vai ser mencionado. O que as próximas gerações vão sentir saudade mesmo é do ... papel! Pura e simplesmente.

Pra você ver: eu estou escrevendo tudo isso sem matar nenhuma árvore?!

15 de abr. de 2016

Auto traição

Se até eu mesma me traio, o que esperar do resto da raça humana?

Esses dias chamei a atenção de uma amiga. Ela estava reincidindo numa atitude que eu não achava legal então resolvi conversar em particular.  Mas errei. Não por ter tentado conversar, mas por não ter percebido sua incapacidade emocional de lidar com aquele tipo de diálogo.

Sabe o fruto da árvore proibida? Você poderia comer todas as frutas do jardim menos o fruto daquela árvore que estava no meio do jardim. Pois é: você pode criticar todos os tipos de defeitos de uma pessoa menos um: se o defeito for justamente o de não  suportar ser criticado. Porque se criticar isso, o errado é você, que sabia da incapacidade e ainda assim abriu o bico.  Esse tipo de crítica só vai terminar bem se você estiver errado e a pessoa for madura e souber dialogar. Se você estiver certo o stress está garantido.

Ora, se você sabia que a pessoa se sente profundamente agredida quando é questionada, o que estava esperando receber de troco quando questionou? Esperava que ela concordasse? Que dialogasse? Que refletisse? Que se enxergasse? Se a incapacidade dela é justamente nessa área!

Se você está certo, errou em abrir a boca. Porque para alguém assim um toque é sempre como um soco no estômago e uma advertência é sempre recebida como um tribunal de humilhação. Ela vive em carne viva e você não tinha nada que encostar.

11 de abr. de 2016

Encontro - Marcos Quinan


Amigas inseparáveis desde a infância, na adolescência e até se formarem. Juntas viveram na juventude, sonhos, anseios, as paixões e alguns amores.

Juntas cruzaram a época das maiores contestações, repressões. Foram despojadas e vaidosas, queriam conquistar o mundo. Lutaram pela liberdade e pela justiça. Cometeram transgressões e rebeldias, sempre juntas, confidentes, irmãs.

Perderam-se depois da faculdade. Uma casou-se, viveu a paixão e o amor; depois, todos os sentimentos multifacetados contidos no casamento.

Teve filhos, a casa dos sonhos, jóias nem sonhadas, viagens de férias e a atenção do grande amor. Quando os filhos cresceram, separou-se, perdida em seus valores.

Na outra, a paixão era latente; apaixonava-se perdidamente e, noutro instante, o coração estava disponível. Tinha muita coragem, seus casamentos duravam poucos anos; não tivera filhos, nunca morou muito tempo no mesmo lugar, na mesma cidade, no mesmo país.

Ficou famosa escrevendo biografias. Agora, vivia afastada do meio literário, perdida em sua coragem.

No aeroporto, cruzaram-se no saguão. Uma voltando para o que não conseguira ser, a outra indo buscar o que tinha ficado no seu desejo; não se reconheceram.

Apenas se desculparam pelo esbarrão.

7 de abr. de 2016

Tem louco fofo? *


Vez por outra escrevo sobre os loucos, hora fascinada pelo seu universo misterioso, hora incomodada pelo glamour ralo que lhes atribuem. 

Ninguém entende os loucos, muito menos eu. Às vezes penso na prisão mental em que vivem, naquela falsa liberdade de poder fazer tudo mas estarem aprisionado em um jogo assustador de realidade virtual. Imagina você dentro de um joguinho de video game maldito sem conseguir sair. Assim imagino a mente dos loucos, por isso às vezes tenho pena, às vezes tenho curiosidade e às vezes quero distância porque eles me fazem entrar em um certo tipo de conflito.

Dia desses uma amiga postou no Face um texto glamourizando a loucura. Não glorificava a doidice-doidice, mas uma loucura idealizada, como se fosse possível domar esse mal só até o ponto de ser engraçado e interessante numa sexta feira a noite e deixar de lado a falta de banho, o cheiro de cocô e os acessos de fúria. O texto que ela postou dizia algo como "eu prefiro os loucos do que os chatos normais"  (Veja aqui :  https://osegredo.com.br/2015/06/eu-gosto-e-dos-loucos/) .

Estou tentando (e ainda não conseguindo) calar minha boca no Facebook e descarregar aqui as minhas opiniões e discordâncias.  Quero migrar minha mente para cá. Calma, é aos poucos.

Pois é: não vejo graça nenhuma nesse glamour poético que.tentam dar à loucura. Essa coisa de que "eu prefiro os loucos" só pode ser aceito como texto poético mesmo.  Toda doença é um saco.

O texto mencionado fala na "liberdade" dos loucos em "dançar descalço", "passear na chuva" e coisas assim que os normais não ousam fazer. Isso para mim nada tem a ver com loucura. Tem a ver apenas com liberdade e liberdade é a coisa mais clara e consciente do mundo. Na loucura não cabe liberdade. A loucura é o aprisionamento a um raciocínio torto que escraviza. A loucura é a prisão do pensamento único, do pensamento tortuoso, da imagem persistente.  Dançar na chuva e rir e se colorir é para os livres, os conscientes. E se o cara é muito "doidinho-normal-fofo", vá conviver com ele e pode esperar que ele vai aprontar alguma. Aí o glamour acaba.

Estar louco é se divorciar da coerência. Não vejo graça nenhuma nisso. Odeio a incoerência, motivo pelo qual quanto menos louco pra mim, melhor.  Louco é aquele que nunca está no seu mundo, não entende o que você diz.  Não prefiro os inconsequentes, os que não medem seus atos nem suas palavras, os auto destrutivos,  os pródigos,  os problemáticos.  Esses "loucos maravilhosos" são uma beleza na vida dos outros, na casa dos outros, enchendo o saco dos outros. 

A incoerência,  para mim, é uma pedra no sapato, é uma música alta demais que não me deixa seguir em frente. É um incômodo que precisa ser detido, precisa ser resolvido. Talvez até todo mundo prefira os loucos... mas eu não sou "todomundo".

3 de abr. de 2016

Room


Esse é o nome do filme O Quarto de Jack. Vá lá e assista.  Ele trata sobre a dificuldade de uma pessoa retomar a vida depois de um grande trauma - no caso sequestro. Sequestro não: rapto.

Pra mim o filme não é bem sobre isso.  Tive a impressão de que apenas quiseram ser originais e passar boa impressão. Passar "uma ideia mais evoluída", então falaram sobre o desejo politicamente correto de deixar pra lá o pensamento obsessivo por vingança e pensar no que realmente importa: tocar a vida em frente, reconstruir.  Tipo "tá, chega, bora pensar em outra coisa!"

Vi que algumas pessoas acharam que a história ficou "meio que pela metade" porque deu pouca trela para o destino do ofensor. Já para outros o filme foi perfeito porque saiu do lugar-comum.  Já existem milhares de filmes policiais que mostram sofrimento-investigação-redenção-justiça.  E esse filme quis ser diferente, quis falar sobre o day after.

Tá. Mas não há day after que aguente sem uma resposta ao monstro, sem uma punição. Não precisariam gastar meia hora nisso. Umas poucas cenas já trariam alívio à nossa sede de justiça. Foi meio que desumano deixar a gente no vácuo só pra posarem de mente evoluída. Eles nos deviam isso.

Não, o filme não deixou o bandido solto. Só o deixou "pra lá", tipo "a lei cuida dele, eu tenho mais o que fazer".  Esse pessoal tem sangue de barata mesmo. Não entendem que não dá pra seguir em frente com um mínimo de sanidade se não pudermos imaginar a cena memorável de um homem daquele sendo julgado, condenado e passando o resto da vida em uma cela de 2 por 2.

Perdão... Perdão...  Assisti agora pela manhã um vídeo justamente sobre perdão. Dá pra notar que estou gatinhando nessa área.   Nesse vídeo é mencionada a história inacreditável de Mandela perdoando pessoas que lhe impingiram sofrimentos inacreditáveis por anos. Quando penso nisso, tudo se contorce por dentro e me sinto um verme. Não sei como eu me sentiria no lugar dele. Embora eu saiba do fundo do meu coração que o rancor só maltrata quem o sente e que o perdão não é um prêmio para o ofensor, mas para o ofendido, ainda assim... Ai...

Gosto de imaginar que se eu passasse todos aqueles anos presa talvez eu até evoluiria. Entenderia que só se retirasse da alma toda a amargura é que eu não enlouqueceria. Talvez na juventude Mandela não tivesse capacidade nenhum de perdoar. Pode ser que ele tenha crescido em sabedoria justamente com o sofrimento. Talvez  em seus piores momentos ele tenha pedido misericórdia a Deus para que sua alma não apodrecesse de ódio e Deus pode ter ouvido suas preces. Talvez. Talvez eu até pudesse vir a ser Mandela se passasse por todo o processo "de purificação" e crescimento que ele passou.  Sei lá. Melhor pensar assim.

Dizem que a vingança não satisfaz e que a pessoa não sente nenhum tipo de alívio depois de praticá-la.  Alívio total e cura, só com o perdão. Mas na falta de perdão só a justiça consegue aliviar uma grande ferida. E na falta de justiça,.. só a vingança consolaria.

Não, não quero acreditar nisso. Não posso acreditar que as melhores pessoas que conheço estavam erradas e que as piores pessoas, essas sim, estivessem certas.

Jamais me vinguei de ninguém. Também jamais fui alvo de um crime dessa monta - como no filme ou como na vida de Mandela. Já fui alvo de outras injustiças e afrontas menores que não me inspiraram sentimento apocalípticos. Exceto quando fui assaltada.

O que eu fiquei sabendo, quando fui assaltada,  é que a raiva gera fantasias de vingança tão intensas quanto as fantasias sexuais. Absolutamente intensas e exigentes de realização.  E todos sabemos que as fantasias são o único consolo de quem não pode se realizar. No sexo a realização alivia, dá alegria, sensação de paz e plenitude. Será mesmo, então, que a realização das fantasias de vingança não tranquilizam do mesmo jeito? Ou depois do prazer da vingança, ao invés de vir a paz, vem a tristeza? E ao invés do sentimento de plenitude vem o sentimento de degradação?  E pra piorar dizem que "a vingança nunca é plena"; nunca satisfaz. Seria como um orgasmo que se anuncia mas nunca se completa.

Não sei, não sei... A única coisa que sei é que da minha torre de impotência já fantasiei vinganças que jamais pretendi realizar. Nunca me vinguei.  E espero jamais precisar descobrir na prática como essas coisas funcionam.


REALIDADES BRASILEIRAS